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Minha vez

Eu estou na merda; não há dúvidas quanto à isso. Para que eu fiz tudo aquilo? O que ganhei com isso? Dei amor e o que recebi em troca? Um breve olhar enquanto todos me deixaram; obrigado por nada. A saúde está precária, o dinheiro se foi, os amigos são poucos, a família era melhor não ter, o trabalho parece inútil, e o coração... Bom, nem vamos entrar nisso. Mas em se tratando de partes, não sei o que dói mais; o coração ou a cabeça, que anda latejando há três dias, e não parece que vai passar tão cedo. Ultimamente o último pensamento do dia antes de ir dormir tem sido, "veremos o que de ruim acontecerá amanhã", e quando a manhã chega nunca falha, outro pesadelo em forma de realidade toma conta. Alguns dizem que é melhor eu nem sair mais de casa. Aliás, qualquer outro em meu lugar já teria tido um colapso nervoso há muito tempo, mas eu não; de todas as coisas ruins, minha teimosia ainda reina.

O que pareciam ser boas lembranças dos últimos seis meses agora parecem mais um prelúdio ao suicídio, completo com toda a decadência de um drama épico cujo qual eu mesmo, em um tempo diferente, até apreciaria, mas quando acontece com a gente a graça se perde. Mas apesar de tudo, algo de estranho ainda mantém-se constante em meio a tanta merda; eu nem chorei. De algum modo nada disso realmente parece estar acontecendo comigo, mas também não parece um sonho do qual eu não consigo acordar. Então eu perdi o chão, e com isso vieram a desorientação e as dores de cabeça que parecem sobreviver até mesmo a um, dois, três, quatro Neosaldinas, mas meu espírito permanece intacto; isso sim eu não sei explicar. Já não é nem mais questão de sentir raiva ou frustração, nem mesmo vontade de descarregar uma metralhadora em alguém, porque convenhamos, Igor, você já passou por coisa muito pior. Isto? Isto não é nada. Ei, mundo real, isso é o melhor que consegue fazer? Não foram por meus sonhos que eu estava lutando; foram pelos seus. E se não fosse por mim, onde vocês estariam?

Uma das consequências de dar atenção às incoerências que os outros falam, como viver no mundo real por exemplo, é que com isso também vem os problemas reais; problemas que nada tem a ver com aquele relacionamento que você não consegue definir, ou fofocas que sairam do controle e chamaram mais atenção do que deveriam, ou comentários acidentais que chegaram aos ouvidos errados. Vocês estão, definitivamente, piores que eu se acham que tudo isso é realmente um problema. Sabe o que é mesmo um problema? Engolir em seco tudo isso que tem me acontecido, e ouvir que não devo me surpreender caso um de vocês tenha um surto a qualquer hora dessas. Se eu te contar a minha história, você vai se tornar muito pequeno para tamanho ridículo que sentirá. Mas talvez seja só a minha dor de cabeça falando agora.

Ter o mundo todo virar as costas desta maneira não é algo novo para mim, porque em comparação aos dramas passados e apesar de todas as cicatrizes que ainda não se fecharam, eu ainda estou aqui. E se eu sobrevivi a tudo aquilo, posso muito bem superar de novo. Pode parecer que eu estou caído agora, mas me aguardem. Logo, logo, será a minha vez de correr atrás dos meus sonhos de novo, sem me preocupar com as vontades de vocês. E vai acontecer, nem que eu tenha que esperar mais seis meses. Minhas lágrimas nem secaram sozinhas desta vez; pelo contrário, sequer eu as derramei. Isto só prova que, sem dúvida, estou ficando cada vez mais forte, cada vez melhor, e cada vez mais ridiculamente experiente para lidar com quaisquer neuroses que eu venha tratar num futuro próximo. Quem dera pudesse atender a todos vocês; pelo menos o dinheiro já estaria garantido.

Chega de fotos comigo de coadjuvante ao fundo. Chega de prestar favores apenas para ser esquecido instantes depois. Chega de colocar os sonhos dos outros afrente dos meus. Quando essa dor passar, seja agora ou daqui há seis meses, tudo será diferente. Pensando bem, tudo o que fiz, eu fiz por mim. Me aguarde, mundo; eu estou voltando. Agora é minha vez.

Ao som de: Rose's Turn - Gypsy.

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