Eu acho que o melhor jeito de definir um dos relacionamentos mais importantes da minha vida – entre meu pai e eu – talvez não seja tão diferente de todas as outras definições de todos os meus relacionamentos. Porque parece que, em se tratando de mim e outras pessoas, uma única resposta vem rapidamente à mente: nós brigamos o tempo todo. Mas em se tratando do meu pai e eu e de todas as coisas que já passamos juntos desde que me mudei para Cascavel, eu posso sinceramente dizer que ninguém nem nenhuma outra briga se compara a nós e as batalhas que travamos dia após dia.
Não posso dizer com certeza como tudo começou, mas dentro da história que escrevo aqui posso dizer que a primeira briga aconteceu exatamente quinze minutos depois que eu oficialmente cheguei à Cascavel: nós brigamos porque meu quarto era muito pequeno. A próxima briga também não demorou muito; cinco minutos depois, nós brigamos porque a partir da próxima segunda-feira, meu pai havia decidido que eu começaria a trabalhar com ele. Depois de mais algumas brigas com o decorrer do meu ajuste à minha nova vida, eu pude lentamente perceber que, apesar de todos os gritos e do estresse que tomava conta de nós quando nossas desavenças explodiam, nós realmente estávamos nos tornando mais próximos. Foi aí que um relacionamento que esteve parado por anos e muitos quilômetros finalmente começou a se refazer. Mas nunca foi fácil; assim como cada briga fazia com que nós ultrapassássemos nossos limites, cada desculpa também nos mostrava o quanto estávamos terrivelmente vulneráveis e assustados demais para saber lidar bem com tantas mudanças ao mesmo tempo. E talvez o maior obstáculo de todos tenha se formado com a minha mudança para meu próprio apartamento, depois que algumas desavenças e nossos gritos simplesmente não nos levaram a nada além de impasses.
Só que o tempo passou, e já estou em Cascavel há quase três anos. E são três anos de muitas brigas e gritaria, mas também de mudanças que eu jamais esperava que pudessem acontecer na minha vida. Mesmo brigando o tempo todo, eu aprendi a ver o quanto nossos conflitos não passavam de diferenças de opinião, mas de duas pessoas dolorosamente iguais. Porque em momentos em que as brigas se tornavam reais, como quando eu larguei a faculdade de Jornalismo ou até mesmo quando eu decidi morar sozinho, meu pai e eu não gritamos; apenas trocávamos olhares de silêncio, porque sabíamos que mesmo não parecendo ideal, aquela era a decisão certa a ser feita. E mesmo morando separados e longe de novo, sempre sabíamos quando era a hora de nos reunirmos para celebrar aniversários, noites de natal ou ano-novo, até finalmente reaprendermos a simplesmente aproveitar um jantar ou um filme em uma noite qualquer, sem nenhuma ocasião especial além do fato de que um pai e um filho, depois de uma longa semana de trabalho e dores de cabeça, gostariam de passar um tempo juntos.
Hoje nós ainda brigamos. Bastante. Talvez até demais, considerando tudo que já aprendemos um com o outro. Mas nós crescemos um pouco, e aprendemos a deixar o outro em silêncio durante desavenças pelas quais não vale a pena levantar o tom de voz. Assim como também estamos lentamente percebendo o quanto podemos aprender ainda mais um com o outro. Demorou muito tempo para que eu pudesse enxergar e aceitar isso, mas era fato: nós brigamos, gritamos, enfrentamos e desafiamos um a outro constantemente porque somos iguais, e tudo que queremos é que nos tornemos cada vez melhores do que somos, através de trabalho duro e honesto e de um relacionamento de pai e filho que quase foi perdido, mas que no fim renasceu e continua firme e forte com cada briga que compartilhamos. Nós brigamos porque nos importamos.
Nós gritamos porque estamos desesperados para que o outro ouça o quanto esse amor de pai e filho está vivo em nós, e a cada briga, mesmo com a cabeça quente e o estresse me causando cabelos brancos com apenas vinte anos de vida e irresponsabilidade, eu sempre me lembro disso. Você grita comigo porque se importa; e eu te enfrento ainda mais porque te amo, pai. E nenhuma briga vai mudar isso.
Ao som de: Sometimes You Can't Make It on Your Own – U2.
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