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Plano B

Eu acho que a pior coisa que pode acontecer a um escritor é ter a vontade de escrever queimando dentro de si, mas ainda não ter as palavras certas para marcar o papel com exatamente tudo aquilo que ele realmente deseja dizer. E apesar de todas as palavras que já deixei aqui antes, alguns podem pensar que este é um processo que ficaria mais fácil à medida que continuo a tentar dar forma e pontuação aos meus sentimentos, mas a verdade é que isso só se torna cada vez mais difícil, para não dizer que ficou complexo o bastante para que eu mesmo me perca dentro do que eu estou tentando dizer aqui. Na verdade, acho que o que está me perturbando é isso mesmo: a incapacidade de me ocupar enquanto as palavras certas, assim como as pessoas certas, os lugares certos e as oportunidades certas, não me vem à mente ou cruzam meu caminho. E não acho que estou sofrendo com isso sozinho.

Nós temos esse hábito desconcertante, porém repetitivo, de tentar traçar planos para nossas vidas; desde as pequenas metas que desejamos atingir até os grandes objetivos que sentimos que, uma vez conquistados, trarão sentido e glória à nossa existência. E com meros vinte anos, eu costumava acreditar que encontrar o amor seria o objetivo decisivo da minha vida. Mas, adivinhe só, eu estava errado. Estranho mesmo é criar certas teorias para mim mesmo e ainda assim me pegar sorrindo quando descubro que estou errado. Me faz pensar o quão pouco eu sei sobre a vida, e o quanto deve estar à minha espera – inclusive coisas que eu nem espero encontrar. Mas foi a partir desses pensamentos que eu tentei ocupar o tempo que está me distanciando de toda a felicidade que eu acredito que ainda está longe com outros momentos marcantes, como mobiliar meu novo apartamento ou me aplicar de verdade aos meus estudos para sentir que terei mesmo um futuro dentro desta profissão mentalmente desafiadora que é a Psicologia. Mas, claro, eu posso estar errado.

A verdade é que não dar tanto enfoque ao amor, ou a falta dele, ainda é algo muito novo para mim. Talvez seja até compreensível; como algo que um dia foi a razão que me tirava da cama de manhã, passou a ser um mero detalhe que pretendo conquistar em um amanhã distante? Encontrar o amor sempre foi a minha busca incansável, o motivo da minha ansiedade e a causa de todos os problemas que já encontrei neste pequeno fragmento de vida que tenho, mas também foi o que me levou a conhecer pessoas incríveis, lugares sensacionais e me deparar com oportunidades únicas que jamais serei capaz de esquecer. Só que agora tudo isso faz parte do passado e as coisas mudaram hoje em dia. Hoje minhas preocupações são as contas que tenho que pagar, se o sofá novo vai pegar muito sol naquele canto da sala, se eu me lembrei de deixar comida o bastante para o gato antes de sair de casa, ou se ando muito distante dos meus amigos ou quem sabe até desconectado demais do mundo pro meu próprio bem depois que esses remédios me fizeram abdicar grande parte da minha fonte de diversão – e com ênfase na palavra "fonte", porque ultimamente beber é que o tem unido muita gente por aí. E costumava me unir também; não é a toa que me sinto desconectado.

Acho que o que eu estou tentando dizer com tudo isso é que ao me lembrar de quem eu costumava ser, das coisas que eu queria da vida e de como eu achei que seria quando crescesse, eu só nunca achei que me tornaria alguém tão responsável, sensato e terrivelmente verdadeiro como pareço ser hoje, ao contrário de um garoto engraçado, ansioso e desesperado para encontrar o amor da sua vida amanhã de manhã quando saísse para caminhar – alguém que quando refletia no espelho, não me trazia dúvidas ao dizer, "É, esse é o Igor". Mas acho que a vida tem mesmo dessas coisas; às vezes queremos tanto uma coisa e por tanto tempo, e tentamos tanto nos ocupar com outras coisas enquanto isso, que nem percebemos que aquilo que mais desejávamos um dia acabou por se tornar o plano B em nossa lista de desejos. Eu nunca tive um plano B antes; tudo que eu sempre quis foi amor. Por isso está tão difícil para me acostumar com o fato de que outras coisas hoje vem em primeiro lugar, como contas, móveis novos, a comida do gato ou outras responsabilidades. Porque houve um dia em que só o que vinha em primeiro lugar para mim era meu próprio coração, e a busca por alguém para preencher o vazio que existe nele, que na verdade não passa do espaço que sempre deixei reservado para o amor da minha vida. Com todas essas conquistas ao meu redor, talvez esteja na hora de colocar o plano B em ação de novo.

Ao som de: Nowadays – Chicago.

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