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Um pouco mais de segurança


            Eu acho engraçado reparar que o quanto mais fantástica é a pessoa que hoje faz parte da minha vida, mais irônica é a história de como isso aconteceu. E você e eu não somos exceção. Pelo contrário. Se eu parar pra pensar nas pessoas que eu jamais esperava conhecer, não por alguma falta de afinidade, mas por desencontros de oportunidade, é provável que a nossa história seja a mais infame. O que automaticamente faria dela a melhor.
            E qual é a história, afinal? O ano foi 2012. O lugar foi uma cervejada ensolarada nos arredores de Cascavel. Eu não estava muito acostumado com aglomerações alopradas e alcoolismo liberado em plena luz do dia, acompanhados das trilhas sonoras mais ridiculamente aleatórias possíveis, mas diante das opções disponíveis para aquele fim de semana, era o que restava. Eu estava usando uma camiseta preta com um pequeno símbolo indescritível de uma marca desconhecida, quando eu e meus amigos encontramos nossos outros conhecidos, ao redor de um mar de gente embriagada e desestabilizada que dava risada de tudo. E entre todas aquelas pessoas, aqueles copos de cerveja jogados no chão e aquele sertanejo universitário barulhento, eu quase conheci você.
            Não fomos apresentados, mas você estava naquela roda de colegas e semi-conhecidos, nos quais eu ainda estava tentando encontrar algum sentido – partindo daquelas pessoas, até buscando apoio da cerveja. Eu estava perdido, mas disposto a tirar algo de bom de uma situação anormal. De uma festa estranha com gente esquisita. Foi aí que alguém – como eu aprendi que é de costume nessas festas – gritou “foto!” e todos se posicionaram diante de algumas câmeras de celulares. Eu não sei se foi o destino, a vida, ou apenas as pessoas ao redor que nos empurraram pra cabermos na foto, mas você apareceu do meu lado. E depois que postaram a foto no Facebook e encheram aqueles rostos de marcações, eu aprendi o seu nome. Foi assim que eu conheci Dayane Zanella. E algum tempo depois, eu descobri como você me conheceu. Você achou que eu era um segurança da festa que estranhamente apareceu do seu lado. A vida tem dessas coisas.
            Mais engraçado ainda foi que, depois daquele dia, você aparecia em todos os lugares que eu ia. Em todas as baladas em que eu decidia ir em cima da hora, os barzinhos que eu visitava de madrugada antes de voltar para casa, e nas conversas com meus amigos, que eram amigos de amigos que eram da sua cidade e que, consequentemente, eram amigos seus também. Você estava em todos os lugares, o que hoje eu percebo que foi como um sinal do universo. Daqueles que eu costumava ser fanático pra encontrar, mas que hoje passam batido por mim porque eu ando cansado e desiludido demais e que, salvo algumas desilusões amorosas e telhas de amianto, o universo tem coisa melhor pra fazer do que jogar sinais no meu caminho. Mas aquilo sim era um sinal.
            Aonde quer que eu fosse, lá estava você. E isso durou alguns meses até exatamente este dia, um ano atrás, quando eu recebi um convite para uma festa de aniversário em Ibema. Um convite da sua festa. Da pessoa que achava que eu era um segurança. Eu não sabia exatamente quem era você, ou exatamente aonde ficava Ibema, e deixei o convite passar batido. Até receber um telefonema irritado de uma pré-aniversariante indignada cujo número eu nem tinha, mas que me atendeu uma frustração do mesmo tamanho da minha surpresa:

- Como assim você não vem na minha festa?!
- É que eu ando meio cansado, com umas coisas pra fazer... Achei que não ia fazer diferença...
- Pois faz diferença sim! Você vem e ponto final, nem que eu tenha que ir aí te buscar!
- An... Ok.


            Um ano depois, nós nos reencontramos em outra festa. Você ainda parecia ficar muito entusiasmada com a minha companhia, embora eu não conhecesse muito sobre você. Mas nós nos divertimos na festa, e em uma festa depois da festa, e em outra festa uma semana depois. Até que em uma noite qualquer, depois de publicar mais um post melancólico de Domingo, uma conversa sua apareceu na tela do meu computador. Dizendo que eu escrevia muito bem, e que você queria que eu escrevesse sobre você. Bom, pra escrever sobre você eu preciso te conhecer melhor. E não deu outra. Quando eu vi, nós já estávamos planejando um jantar com amigos, e discutindo sobre quantas cobertas você ia precisar pra dormir aqui em casa, e que essência de arguile você preferia, e que cadeira você achava melhor pra sentar e apoiar os pés na beira da sacada, e como havia sido o seu dia.


Com você eu aprendi que minha honestidade jamais é desperdiçada, que meu tempo é valioso e que meu cansaço é compartilhado. Com você eu aprendi que as pessoas são complicadas, ocupadas, corridas, atarefadas e silenciosamente desesperadas, mas que se a gente der sorte, ou simplesmente estar alerta para alguns sinais que a misericórdia do universo ainda é capaz de jogar no nosso caminho, você pode encontrar alguém que jamais esperava que pudesse se tornar tão importante. Alguém que, em um dia qualquer, você avistou em uma festa. Alguém que, na maior das coincidências, apareceu do seu lado. Alguém que, felizmente, tem o mesmo dedo podre para escolher amores como você, sente o mesmo peso do mundo sob as costas como você, e dedica sextas, sábados e madrugadas inteiras só pra te ouvir. Porque a dor que eu confesso à você é muito parecida com a que você sente. E, um ano depois de me confundir com um segurança, você descobriu que estava segura comigo também.
            E foi assim que a Day se tornou parte da minha vida. Obrigado por me conhecer.

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