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Mostrando postagens de setembro, 2014

O colapso da colônia

   Nunca subestime o poder da sua teimosia. Era pra ser só mais um daqueles Domingos nublados e existencialmente tediosos, completo com maratonas de filmes, séries, besteiras gordurosas e litros de refrigerante, seguidos pela iminente depressão do Domingo à noite que começa lá pelas seis da tarde e só termina quando a última gota de uma garrafa de vinho passa a fazer parte da minha corrente sanguínea. Mas aí eu resolvi me colocar pra fora de casa um pouco ao passar alguns minutos de sabedoria na sacada, olhando o horizonte e pensando singelamente e filosoficamente na minha vida, quando eu percebi uma metáfora perigosamente pendurada acima de mim, na forma do maior vespeiro que eu sequer poderia conceber que existia ali. O lado bom da Primavera envolve todas aquelas coisas sobre renascimento, desabrochar das flores, o centro da cidade enfeitado com árvores que desfilam pelos postes e ruas com seus verdes, rosas e amarelos chamativos, e uma boa dose de inspiração para escrit

O efeito dominó

       Alguém me quebrou. E um dos motivos pelos quais eu ando evitando escrever, também serve para explicar porque eu ando evitando sentir certas coisas. E como escrever invariavelmente envolve enfiar uma faca no coração e torcer até            que as palavras que vazem dele formem algum sentido, eu tenho tomado um pouco mais de cuidado mediante os meus passatempos masoquistas ortográficos. Porque, pior do que admitir que alguém me quebrou, seria sentar e escrever sobre isso. Mas já é Domingo à noite e as expectativas para transformar este prelúdio à migração para o sofá, colocar um filme qualquer e adormecer em frente à televisão já expiraram. Então por que não criar um pouco de adrenalina para mim mesmo para pensar e sentir sobre você?    Particularmente, eu gosto de escrever para você. “ Você ”, que pode ser qualquer uma que vaga aleatoriamente pela órbita das minhas neuroses. “ Você ” que, apesar de ter um nome de verdade e, suspeito, um coração de mentira, ainda é capaz d

A resiliência do quilômetro 157 (final)

Parte 2    Antes que meu pai pudesse retomar seu sermão, uma Honda Biz surgiu rapidamente e desacelerou até chegar perto de nós para perguntar se ele era o Marcio sobre o qual o Gaúcho tinha falado. Era o Augusto, armado com sua caixa de ferramentas e maior disposição para ajudar do que o último mecânico. Ao contrário dele, Augusto era quieto e pacato, e analisou as peças do motor com as mãos até concluir que aquela vela tinha concerto sim – era só usar a chave certa, que por acaso tinha ficado para trás na oficina. Augusto montou de volta na moto e avisou “ volto já! ” antes de desaparecer no horizonte da estrada.    A essa altura já deveria ter passado cerca de uma hora. Não acompanhei o tempo da nossa parada não planejada no relógio, porque estava mais preocupado em matar os borrachudos que tinham conseguido entrar no carro antes que eu o fechasse para me refugiar. Quando vi que as coisas não ficariam mais fáceis do lado de dentro do carro, saí novamente e comecei a andar

A resiliência do quilômetro 157 (parte 2)

Parte 1    Antes de investigar o motor , meu pai abriu o porta-malas para conferir se estava com suas ferramentas. Deixou sua porta aberta depois que a vela disparou pela segunda vez. Até nos conformarmos de que poderíamos ficar ali por algum tempo, meu pai deixou todo o carro aberto. O rádio ainda estava ligado, tocando as músicas do pen drive que eu trouxe para a viagem. Ouvir música era só o que podíamos fazer enquanto esperávamos pela ajuda. Voltei para o meu lugar no carro, pensando se talvez teria sido melhor ficar em casa, ou se era eu quem tinha o dom de atrair problemas e situações adversas. E continuei aumentando o tamanho do problema na minha cabeça, enquanto meu pai caminhava aleatoriamente pelo acostamento até que um carro passou por nós lentamente e deu ré até se alinhar ao andar do meu pai. - Ei, você que é o Souza? - Souza? - É, Souza. O dono desse sítio que fica nessa descida de terra aqui, do lado daquela árvore ali. Eu te liguei mais cedo sobre um moto

A resiliência do quilômetro 157 (parte 1)

    Antes de qualquer coisa , eu gostaria de confessar que gostaria muito de ser um homem de uma metáfora só. Acho que se eu baseasse as minhas concepções de vida em apenas uma imagem abstrata, eu não teria essa compulsão por procurar significados escondidos em situações adversas. E acho que também seria uma ótima base na qual eu poderia apoiar meu futuro comprometimento por uma garota só, ao invés de ficar procurando por significados escondidos em relacionamentos imaginários. Mas nada disso realmente tem a ver com o que aconteceu desta vez; quer dizer, tem um pouco a ver. Porque, bem como já é de costume, não foi apenas uma situação adversa que aconteceu. Não. Foi uma metáfora. E das grandes.    Viajar para Londrina de carro com o meu pai já provou ser uma situação adversa por si só, mas acho que entre tantas idas e vindas só neste ano, nosso roteiro de viagem parece não incluir mais silêncios constrangedores duradouros e discussões que acabavam sendo mediadas por pedágios, porq

A garota certa

   ...talvez eu só esteja admitindo uma dificuldade. Apesar do meu trágico histórico em matéria de relacionamentos, eu costumava acreditar que sempre seria um otimista. Isto é, até o belo dia em que me lembrei que a vida não é feita apenas de amor, mas de louça suja acumulada na pia, relatórios atrasados de faculdade, boletos vencidos que podem mais ser pagos em uma lotérica e idas frustrantes ao mercado em que eu sempre me esqueço do item em especial que era justo o que me obrigou a ir até lá. Aí eu me lembrei do amor e do quanto isso costumava ser a única coisa com a qual eu me importava. O que costumava me motivar a passar madrugadas escrevendo sobre relacionamentos imaginários , sobre não permitir que o " mundo real " extinguisse a minha visão romântica, e sobre como seria fantástico conhecer a garota certa . Pra ser sincero eu não sei dizer exatamente o que foi que aconteceu comigo ao longo dos anos, mas entre tarefas domésticas diárias e obrigações acadêmicas adiad

A próxima estação

    Se existe algo para ser lembrado depois que 2014 acabar, definitivamente será a verdade de que tudo sempre muda. Depois de perder um emprego, de vivenciar algumas dificuldades familiares, de aprender a abrir mão de amores imperfeitos e de aceitar a realidade de cada novo dia que nasce, eu finalmente percebi que a minha paixão por padrões, rotinas e portos-seguros talvez não tenha muito espaço para existir em um mundo onde o status quo parece ser cada vez mais temporário. Porque até mesmo nós somos temporários, e irremediavelmente encarregados de tornar o tempo que temos por aqui em algo significativo. E para cada momento que deixamos passar em branco, é uma oportunidade que se vai e não volta. Talvez seja daí que venha a minha necessidade constante de me colocar em frente a uma folha em branco do Word para dissertar sobre a minha vida. Pode não ser uma vida perfeita, ou particularmente organizada, ou até mesmo das mais acolhedoras, mas definitivamente é algo pelo qual eu sint