Pular para o conteúdo principal

Deixe ela ir


Eu sinceramente esperava que não chegasse a esse ponto, mas às vezes acontece. Não importa quantas vezes ao dia você pense nela. Ou quantas músicas parecem ter sido feitas só para vocês. Ou as noites passadas em claro, porque não havia o que fazer a não ser esperar o sol nascer para, quem sabe, encontrá-la de novo por aí. E a verdade é que talvez você a encontre mesmo; só não será mais como antes. Dessa vez vocês serão estranhos. Você não tem mais nada a ver com ela. E ela... Bom...

Ela não é sua.

***

Aos vinte e poucos anos, eu confesso que acreditava que minha vida estaria mais organizada do que isso. Talvez não financeiramente... E ao julgar pelas minhas opções profissionais, talvez nunca financeiramente. E quem sabe não precisaria envolver um apartamento só meu de novo. Com o tempo você aprende que fazer parte de uma família significa que você jamais estará sozinho... Lide com isso. Mas, emocionalmente, ah... Eis aqui a eterna variável da equação. E por “variável”, entenda como a série de primeiros encontros, segundas intenções e terceiras pessoas às quais me refiro em textos como esse, quando as coisas entre nós não dão certo.

Por que não deram certo? Era só isso que eu queria saber. Você pode não se importar mais comigo, ou com o que faço ou deixo de fazer por aí. Pode até não dar a mínima para quem se arrisca a me dar uma chance, mesmo em meio à desconstrução que você deixou para trás. Mas seria injusto da minha parte dizer que é tudo culpa sua – claro que não é. Relacionamentos começam e terminam do mesmo jeito: com um consenso entre duas pessoas. Mesmo que o consenso seja obrigatório, no fim.

Eu não posso obrigá-la a ficar comigo. E não posso me obrigar a fingir que você não existe. Afinal, você ainda está por aí; freqüentando os mesmos bares, passando pelas mesmas ruas, falando com as mesmas pessoas que eu. Mas há uma coisa que você não pode me impedir de fazer: sentir a sua falta. E é algo que eu decidi que faria, por mim, até que não sobre mais nada para sentir. Você foi embora, mas não desapareceu.

Nós tínhamos tudo. O companheirismo, a química, as promessas... E é possível que a minha frustração esteja mesmo na sua partida, da noite pro dia, que deixou interrogações abertas até agora. Foi algo que eu fiz? Algo que não fiz? Ou eu simplesmente não era “o cara” que você procurava?  Eu não sei. E se depender de você, eu nunca saberei.

Houve um momento em que você faria qualquer coisa por mim. Contava os minutos para me encontrar. Confessava que nunca havia encontrado alguém como eu. E se entregou sem medo ou culpa alguma, porque eu estava lá para te abraçar. E foi bom. Muito bom. Eterno, inclusive, enquanto durou. Até que em algum momento similar àqueles, acabou para você. E eu preciso aprender a lidar com isso de uma vez por todas. Precisa acabar para mim também.

Eu quero as mãos dadas no shopping. As mensagens de “bom dia” e “boa noite”. Os lembretes do que preciso comprar no mercado a caminho de casa. Os pitacos enquanto escolho qual vinho iremos beber. As implicâncias com o meu jeito grosso de falar às vezes. As alfinetadas quando você percebe que não estou falando direito com a minha mãe ao telefone. Os jantares à luz de velas. Os almoços de domingo com a sua família. As conversas sussurradas em corredores tumultuados. As pernas entrelaçadas debaixo do edredom. O meu nome em sua voz ao pé do ouvido. O amor... Eu quero o amor. E queria que simbolizasse você.

***

Eu sinceramente esperava que não chegasse a esse ponto, mas aconteceu. Acabou. Eu não quero mais você. Só o que restam são os seus defeitos, suas desavenças, suas inconstâncias, suas más companhias, suas manias irritantes, e o símbolo de vários outros sentimentos que nada tem a ver com amor. É triste, mas aqui estamos... Bom, ao menos, eu estou. Você nem chegará perto desse texto. Nem ninguém próximo de você. Estou sozinho, emoldurando o que restou de nós para deixar guardado aqui. Como lembrete de que, quando foi bom, foi incrível. Você gostava assim. Mas quando o amor acaba, as lembranças se desprendem, os beijos parecem nunca ter existido, as promessas são esquecidas, e tudo que um dia houve de bom entre vocês enfim fica para trás, só resta uma coisa a fazer.

Deixe ela ir.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Os 5 estágios do Roacutan

            Olá. Meu nome é Igor Costa Moresca e eu não sou um alcoólatra. Muito pelo contrário, sou um apreciador, um namorador, um profissional em se tratando de bebidas. Sem preconceito, horário ou frescura com absolutamente nenhuma delas, acredito que existe sim o paraíso, e acredito que o harém particular que está reservado para mim certamente tem open bar. Já tive bebidas de todas as cores, de várias idades, de muitos amores, assim como todas as ressacas que eram possíveis de se tirar delas. Mas todo esse amor, essa dedicação e essas dores de cabeça há muito deixaram de fazer parte do meu dia a dia, tudo por uma causa maior. Até mesmo maior do que churrascos de aniversário, camarotes com bebida liberada e brindes à meia noite depois de um dia difícil. Maior do que o meu gosto pelos drinques, coquetéis e chopes, eu optei por mergulhar de cabeça numa tentativa de aprimorar a mim mesmo, em vês de continuar me afogando na mesmisse da minha melancolia existencial.            

A girafa e o chacal

Melhor do que os ensinamentos propostos por pensadores contemporâneos são as metáforas que eles usam para garantir que o que querem dizer seja mesmo absorvido. Não é à toa que, ao conceituar a importância da empatia dentro dos processos de comunicação não violenta, Marshall Rosenberg destacou as figuras da girafa e do chacal . Somos animais com tendências ambivalentes – logo, nada mais coerente do que sermos tratados como tal.  De acordo com Marshall, as girafas possuem o maior coração entre todos os mamíferos terrestre. O tamanho faz jus à sua força, superior 43 vezes a de um ser humano, necessária para bombear sangue por toda a extensão do seu pescoço até a cabeça. Como se sua visão privilegiada do horizonte não fosse evidente o suficiente, o animal é duplamente abençoado pela figura de linguagem: seu olhar é tão profundo quanto seus sentimentos.  Enquanto isso, o chacal opera primordialmente pelos impulsos violentos, julgando constantemente cada aspecto do ambiente ao seu re

Wile E.: o gênio, o mito, o coiote

Aí todo mundo no Facebook mudou o avatar para a imagem de algum desenho e eu não consegui achar mais ninguém, mas depois de um tempo eu resolvi brincar também. O clima de celebração do dia das crianças invadiu as redes sociais de tal maneira que todos nós acabamos tendo vários flashbacks com os desenhos de nossos colegas, dos programas que costumávamos assistir anos atrás quando éramos crianças e decorar o nome dos 150 pokemons era nosso único dever. E para ficar mais interativo, cada um mudou a imagem para um desenho com qual mais se identifica, e quando a minha vez chegou, não tive dúvidas para escolher nenhum outro senão meu ídolo de ontem, de hoje, e de sempre: o senhor Wile E. Coiote. Criado em 1948 como mais um integrante da família Looney Tunes, Wile foi imortalizado pelo apelido e pela fama de fracassado em sua meta de vida: pegar o Papa Léguas. Através de seu suposto intelecto superior e um acesso ilimitado ao arsenal de arapucas fornecidas pela companhia ACME, Wile tento