A cada dia que passa eu me convenço mais de que o começo das coisas é sempre a parte difícil. E todo dia eu me lembro de alguém, é infalível. Um rosto similar, uma fala, um gesto... Minha mente volta automaticamente para Londrina. Eu vou a pé para o trabalho todo dia, na esperança de criar qualquer tipo de vínculo com a cidade. E é tão difícil quanto o resto. As esquinas são desconhecidas, as avenidas são incoerentes e as pessoas são estranhas. Por sorte, eu compro milk-shakes por dois reais em uma das mil banquinhas de sorvetes que existem espalhadas pela avenida principal. Tudo bem, ninguém me disse que seria fácil. Mas ninguém disse que seria tão difícil, salvo exceção de duas primas minhas que já moraram aqui por alguns anos e logo voltaram para Londrina e que disseram que no começo tudo seria “uma merda”. E tenham dito.
Aí eu faço meus amigos me ligarem a 346 km de distância pra me ouvir, porque ninguém aqui me entende. E é uma das coisas que mais fazem falta; ter alguém pra me entender. Pra me ouvir tenho cobradores de ônibus e clientes que tomam o chopp no balcão da loja achando que é um boteco qualquer – mas eu não falo com eles; um pouco de prudência eu ainda tenho. Peço desculpas por gastarem tanto crédito, mas em troca vocês fazem com que eu me sinta melhor e evitam que eu venda os móveis do apartamento daqui para pagar minha mudança de volta pra minha terra. Também ganhei duzentos reais em bônus, de quebra.
Na faculdade eu me sinto um analfabeto - é um desabafo mesmo – porque, depois de matar mil aulas pra ir ao bar que fica logo ali do lado (ás vezes não sei explicar se isto é intervenção divina ou tentação do capeta), tenho alguns trabalhos atrasados pra entregar. A essência da faculdade parece ser esta: trabalhos em grupo. E não vou nem comentar sobre o desprazer que isto está se tornando. Não adianta, eu sou do tipo faça-você-mesmo e não tem jeito. E não consigo deixar de sentir que todos os outros sessenta e nove da minha sala são melhores do que eu, com seus estágios, empregos na área, blogs inquestionavelmente superiores (pra não dizer, úteis) e aquele ar de jornalista que me falta. Ninguém bate o olho em mim e comenta: “Você deve escrever bem”. De fato, não escrevo.
Mas parei de beber, fumar e estou tentando amenizar minhas falas irônicas e rudes. Por enquanto, as duas primeiras pareceram ser mais fáceis de cumprir. Minha dentista disse que também tenho que parar com a Coca-Cola por motivos de saúde (“Mas se você quiser que seus dentes derretam, pode continuar tomando!”); parece que a única coisa que falta é me caparem. É da minha natureza perceber as coisas óbvias muito tempo depois que as pessoas normais, e, realmente, nada dessas coisas vai preencher o vazio que a saudade está criando.
Eu sinto saudade das ruas que eu conhecia, das pessoas peculiares que sempre cruzavam meu caminho, dos lugares pelos quais eu caminhava, e até mesmo de seres que não merecem importância. Começar tudo de novo é complicado, porém não impossível; mas complicado do mesmo jeito. No entanto, eu continuo fazendo meus amigos me ligarem, só que agora eu também criei vergonha na cara para gastar alguns créditos também. Porque quando meus momentos de fraqueza passam, eu consigo ver tudo claramente de novo. Eu não vou fazer minhas malas e correr de volta, não pela faculdade ou qualquer outro aspecto físico, mas por honra. Eu vim para cá por três razões: para crescer, encontrar um amor, e estudar - nessa ordem. E eu não vou embora enquanto não conseguir.
Hoje eu paguei sete reais em um só milk-shake, e minha vida nova só está começando. Por mais difícil que seja.
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Foram as linhas mais sinceras que já escrevi, desde que cheguei.
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