Quando eu era criança e uma garota sorria pra mim, eu me apaixonava. Não querendo dizer que isso não aconteceu até depois de eu deixar de ser criança - pelo menos, físicamente - mas, quando acontecia, o padrão era o mesmo. Eu sentava e despejava todos os meus sentimentos, sem medir o tamanho das palavras ("vida", "amor", "pra sempre") numa simples carta, tecia com cuidado seu envelope e arquitetava um modo de, discretamente, entregar meu recado à aquela que eu gostaria de entregar também meu coração. Nada mal para uma criança de onze anos.
Até onde eu consigo me lembrar, foi assim que começou o que logo tornaria-se a razão que me tiraria da cama por muitos dias cinzentos e desesperançosos que estariam por vir. Tudo bem, até que... As cartas, a teoria, ficaram para trás e a prática tomou conta, com expectativas ainda mais altas, esforços extremamente superiores à dobra de um envelope, e os sentimentos, ah, os sentimentos cresceram, amadureceram, e a essa altura já não havia nada de discreto.
Mas à medida em que se descobre que corações partidos fazem parte da vida, o sonho enfraquece e as cartas diminuem, já que os destinarários mudam de endereço e não fazem questão de nos avisar para onde vão. A crença de que um dia nossas cartas poderiam ser correspondidas lentamente se esconde e, então, as palavras cessam. Não se encontram mais frases apaixonadas ou parágrafos e mais parágrafos de declamações poéticas, ainda fazendo uso de coisas surreais como "nunca me senti assim" ou "para sempre". Não fazemos mais questão de nos sentir diferentes de como estamos e tomamos noção de que nada é para sempre.
Por isso tem sido tão difícil escrever aqui, para mim mesmo. As palavras fogem quando tento apanhá-las e transcrevê-las, e tudo que resta são os pontos e vírgulas passados que um dia escrevi, no tempo em que o amor que vivia em mim escrevia sozinho. E talvez seja disso que eu mais sinta falta meio ao dia-a-dia apurado e cansativo que alguns chamam de vida; das minhas frases, meus travessões, meu amor.
Venho por meio desta confessar que sinto falta do meu amor platônico, aquela que nunca conheci, e que sinto muito pela ausência. Voltarei a sonhar-te assim que puder; assim que sentir de novo que mereço conhecê-la. Seja como for, por envelope ou virtual, é para você que escrevo, meu alguém. Eu voltarei.
Música de Hoje: I Know Her By Heart – Vonda Shepard.
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