Quando meus pais disseram que eu precisava praticar algum tipo de atividade extracurricular, isto quando eu já havia falhado em demonstrar algum tipo de interesse ou determinação em esportes - já havia passado por judô, taekwondo e várias tentativas de levar natação à sério - primeiro eu quase apanhei por sugerir jogar golf, e em seguida recebi em sala de aula um folheto mostrando todas as opções de atividades que o colégio oferecia. Apenas uma se destacou - teatro - e foi exatamente a que escolhi.
Em pouquissimo tempo o que parecia ser uma atividade obrigatória passou a ser o momento mais esperado da semana; era uma sala especial que ficava no subsolo do colégio no corredor que levava à biblioteca. Aliás, coisas como livros ou artes sempre parecem estar em último lugar em se tratando de prioridades em uma escola; o tamanho da sala nem se comparava ao tamanho da cantina. Aprendi muito com o teatro, como a arte do improviso, o poder do silêncio, o controle das emoções, e a paixão por interpretar e expressar aquilo que está dentro de você para uma platéia, e ser agraciado com aplausos. Fui conquistado por toda a teatralidade que me cercava, mas o sonho não durou muito.
Próximo ao fim daquele ano recebemos a notícia de que nós, o primeiro ano, iriamos estrear uma peça para toda a escola como parte de um novo incentivo ao programa de artes aos alunos. As aulas passaram a exigir mais do meu tempo e ainda mais dedicação do que antes era um simples passatempo, uma distração e um prazer. Ensaiávamos durante todas as horas que podíamos, independente se fossem durante a aula de teatro ou então entre as aulas do horário normal; aqueles com papéis mais importantes até ganhavam licença para deixar as aulas em nome dos ensaios. Falas precisavam ser decoradas, marcações precisavam ser coreografadas, fantasias precisavam ser feitas, tudo enquanto nosso nervosismo crescia a cada dia em que nos aproximávamos da grande estréia.
Não lembro qual peça era, mas eu era a árvore. Mas era uma árvore que falava, e que passava a maior parte da peça em pé. Como era um garoto gordinho na época, passar muito tempo em pé não era muito divertido, tampouco dentro do meu alcance, e o cansaço por fim acabou por me vencer. Eu larguei a peça três semanas antes da estréia, não pelo papel não ser bom o bastante ou por não aguentar ficar em pé dentro de uma fantasia quente. Larguei por medo da estréia; por medo de enfrentar uma platéia e ditar minhas falas corretamente sem que o nervosismo não me dominasse ou afetasse minha atuação. Era uma árvore orgulhosa e perfeccionista, mas todos diziam que iria brilhar mesmo escondido em um toco de madeira postiço.
Não me considerava o mais talentoso, mas era certamente aquele com a teatrialidade mais natural, mais orgânica. Era um artista na arte do improviso e em poder de minhas emoções. Não havia ninguém mais dramático, e desconfio que até hoje ainda não há. Mas não brilhei; meus colegas imploravam para que eu voltasse mas não podia, não me sentia capaz de enfrentar o que seria meu maior desafio até então - arriscar-me a ser vaiado ou então indiferente em comparação ao resto do elenco. Era grande parte do enredo da história, mas ainda assim haviam temores maiores do que minha teatralidade. Larguei, e não olhei para trás.
Não penso tanto em meu passado teatral até meus amigos apontarem o quanto sou dramático; seja ao lidar com problemas como sendo os maiores possíveis, ou me entregando à paixões como se fossem maiores do que a vida, ou então apenas sob total rendição perante minhas emoções ao deixar que meu coração lidere meu caminho neste mundo. Ainda assumo minha teatralidade com orgulho pois é o que faz de mim único, e é o que faz do meu maior sonho ainda mais impossível; o de encontrar alguém tão emotiva e dramática quanto eu. Afinal, se não podemos nos deixar levar por emoções, como podemos realmente sentir que estamos vivos?
Aguardemos então, meu amor, pelos aplausos que virão quando estivermos juntos, e quando nossos dramas aquietarem-se ao nos envolvermos nos braços um do outro a cortina poderá então se abaixar, pois o espetáculo que foi a nossa procura um pelo outro finalmente terá chego ao fim.
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