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O botão do "foda-se", ou guerra fria IV

Estou mais frio do que a cidade, e para quem costuma sentir as coisas mais do que o normal, isto não é um bom sinal. Eu nunca pensei em mim mesmo como alguém que poderia se sentir confortável em viver com indiferença, sem sentir as coisas tão profundamente e sem agir loucamente baesando-se apenas em suas emoções, sem nunca saber ao certo aonde elas me levariam. Mas conforme seguimos adiante neste mundo frio e incansavelmente desgastante, estamos fadados a ter nossas crenças fragmentadas durante o caminho, e quando menos esperamos podemos nos encontrar assim, surpreendentemente despreocupados. A dor que parecia fundamental para fazer nos sentir vivos de repente para de latejar, e uma tranquilidade estranha toma o lugar do que antes costumava ser desespero silencioso para que a vida deixasse de ter tanto drama. Pois é; acabou o drama. Nós simplesmente não demos certo, e para mim você não existe mais. Alguns dizem que este é o momento em que encontramos em nós o botão do "foda-se", e nos tornamos indestrutíveis às mentiras alheias e às decepções que causam em nós. Não me importo mais com o que você possa dizer ou fazer, porque quem eu achei que você fosse na verdade nunca existiu, e quem eu descobri que você é não só não me deixa mais confiar, como me fez deixar de acreditar.

Dissemos adeus e nos reencontramos, e por um instante é como se nada tivesse mudado, mas meus olhos apesar de perdidos não me enganam, assim como aqueles ao nosso redor podem perceber que já não somos mais os mesmos. Mas apesar das coisas não parecerem diferentes, seu sorriso só me faz pensar que eu estava certo, e nada disso realmente causou algum desconforto em você do mesmo modo que mudou a mim. Eu aprendi a sorrir, com certeza; inclusive aprendi a sorrir mesmo quando não tenho vontade, mas prefiro encobrir o que estou sentindo do mundo para não deixar que outros se aproveitem da minha dor. Aliás, descobri um novo tipo de dor; uma dor que, estranhamente, não parece machucar, a não ser que o dano tenha sido tão profundo que meu organismo ainda não tenha dado conta do quanto exatamente estou sangrando. Mas não há motivo para pânico; o botão do "foda-se" foi pressionado, e acabou com as pressões que antes acabavam com meu dia ou até mesmo meu humor; eu não ligo mais, e estou sorrindo por isto.

Ao nosso redor ficaram as promessas desfeitas, as mentiras encobertas, as feridas que não se fecharam, os jogos que não valeram a pena ser ganhos, e as lembranças incertas de quem éramos, mas que ficaram para trás como destroços da minha desilusão, ou acordar como alguns tem chamado, para com a realidade. Talvez o botão do "foda-se" não passe de uma técnica de auto-destruição gradual, e parar de sentir as coisas seja o primeiro passo à total aniquilação do meu ser. Meus sonhos se foram, e me despeço do amor com a mesma força com a qual eu costumava me agarrar nele para construir meus castelos, mas apesar de tudo ter desmoronado, não me sinto como a bagunça de antes. Pelo contrário, pareço mais forte do que nunca, pois não deixarei que pessoas em quem não confiem se aproximem demais de novo, somente para me machucar. Volte para o seu mundo enquanto eu volto a usar preto, com lágrimas secas em meu rosto. A guerra acabou, mas não tenho certeza se alguém saiu ganhando com isto.

Ao som de: Back to Black - Amy Winehouse.

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