Eu tenho uma veia artística que venho exercitando ao longo dos anos com muita dedicação; mesmo que outras coisas em mim morram, como a sensibilidade do amor ou a felicidade com pequenas coisas belas do dia-a-dia, ao menos isto restará em mim.
Comecei a desenhar bem novo, quando a diversão da minha vida era ficar dentro de casa e dar vazão à minha criatividade por mim mesmo em vês de sair e brincar com meus amigos - e, pensando bem, acho que não mudei muito desde então. Quando os desenhos na televisão tornaram-se repetitivo demais, eu comecei a criar os meus e logo meu quarto tornou-se uma bagunça repleta de personagens e lápis de cor espalhados pelos cantos, mas que, quando eu os reunia com minha imaginação, acabavam por resultar nas mais belas e diversas ilustrações que um garoto entediado de doze anos poderia criar.
Durante o ensino médio alguns rabiscos de personagens animados ainda habitavam meus cadernos, mas assim como eu, meus sentimentos cresceram e já não cabiam mais em folhas de papel com desenhos meticulosamente elaborados e coloridos; agora eu precisava escrever para expressar meus pensamentos. O que eu não esperava - logo eu, que odiava estudar a língua portuguesa completa com suas regras, acentos e transições verbais - era o quanto minhas palavras tornaram-se tão meticulosamente elaboradas quanto meus desenhos de infância. Serviram para que eu ficasse rico ao vender redações para outros alunos menos criativos e mais intelectualmente desafiados, e também para que eu optasse por uma área de trabalho bastante promissora: a faculdade de Jornalismo.
A única falha no plano foi que Jornalismo parecia não dar tanta atenção às minhas capacidades artísticas quanto dava a coisas que para mim tinham menos importância, como os acontecimentos do mundo real e outras coisas do tipo. E então eu me vi a sós com meus dotes artísticos de novo, mas desta vez era diferente: desta vez não havia uma direção cuja qual eu estava seguindo para utilizá-los ao meu favor, o que me fez enlouquecer um pouco. Felizmente, enlouquecer só me fez bem e me mostrou qual caminho eu deveria seguir agora: não havia nada mais desafiador para um artista do que encontrar sentido na sua incoerência e sobreviver para contar a história. E qual é o curso que lida com todas as contradições mentais que condicionam e orientam os seres humanos? Psicologia, claro. Não há arte tão bela e pura quanto uma neurose saudável.
E hoje eu continuo assim, produzindo arte como posso: ilustrando personagens, descrevendo suas características mais curiosas, e estudando para que possa ajudá-los a enxergarem sua própria beleza e para que aprendam a lidar com ela. E continuo acreditando que exercitar meus dons artísticos é algo intensamente instigante, mas que seja junto a outras pessoas tão engajadas quanto eu. Porque lidar com naturezas mortas nunca me interessou.
Ao som de: Putting It Together – Barbra Streisand.
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