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Retrato de família



            Começou como uma brincadeira. Na verdade, começou com uma mistura de brincadeira e preguiça. Porque era mais fácil deixar a máquina no canto da estante para enquadrar todo mundo, e combinado com o papel de parede que eu nunca quis mas que parece fazer sucesso, aconteceu que era li que as noites em casa sempre terminavam. Era ali que a família se reunia depois de um jantar, ou antes de sair pra balada, ou só quando estávamos juntos em casa curtindo a companhia um do outro. E decidimos que seria uma boa ideia registrar aquele momento, aquela paz.
            Eu não cresci em um lar onde algo assim era comum. Pelo contrário, nós mal tirávamos fotos. E quando nos lembrávamos de tirar, sempre faltava alguém. Então melhor deixar quieto. Espera todo mundo se reunir de novo, aí tiramos a foto, pra ficar legal mesmo. Bom, nunca ficou legal. Ficaram as lembranças, mas a medida em que eu continuo saindo de casa e vivendo intensamente e aleatoriamente por aí, fica cada vez mais difícil me lembrar daqueles almoços em família, das reuniões de amigos em casa, das pequenas coisas que fazíamos juntos em um Domingo preguiçoso ou um feriado chuvoso.
            Acontece que eu gosto de ter lembranças, e apesar de não ter crescido com essas coisas eu aprendi a ter um certo senso de tradição na minha vida. Aprendi que ter lembranças é maravilhoso, mas que tirar alguns segundos no meio da nossa loucura para registrá-la para a posteridade pode ser ainda melhor. Especialmente durante os Domingos preguiçosos e os feriados chuvosos em que não conseguimos nos ver.
            Mas apesar de não estarmos todos juntos sempre, a família Cascavelense que eu criei para mim, eu ainda faço questão de tentar registrar o máximo da nossa felicidade que eu puder. Para que eu me lembre de como nós fomos divertidos, e para que a gente continue assim. Para que quando a gente se afunde no sofá depois de comer muita pizza, ou depois do tereré esquentar, ou depois que o arguile esfria e morre, a sensação que fica continua sendo muito familiar. Por estarmos juntos aqui no lar que há muito tempo não é mais só meu, e que aos poucos se tornou um centro para reuniões de grupos de apoio, sessões de estudo, jantares em família, festas infames nas noites de sexta-feira, mas principalmente um porto seguro para todos nós.
            Desde a mim até os que precisam de pouso, aos que decidem vir aqui primeiro para depois a gente resolver aonde vamos ou o que vamos fazer do nosso fim de semana e os que aparecem porque ouviram tanto falar daquele sofá, daquela sacada e daquela paz que simplesmente precisaram vir conhecer. E o que fazemos quando alguém vem aqui pela primeira vez, se diverte e promete voltar? Nos arrumamos no sofá, programamos o timer da câmera e seguramos o sorriso e a risada até que o flash dispare.
            Eu gosto de ser um cara tradicional. Não me importo com a rotina desde que ela não se torne enfadonha. Existe uma linha tênue entre o clássico e o tédio existencial, mas eu ainda acredito sinceramente que não cruzamos essa linha. Porque se todas essas fotos, os sorrisos, as brincadeiras, as risadas e os momentos registrados servem para provar alguma coisa, é para mostrar que nunca estivemos tão bem e tão felizes. E que se existe um porto seguro com o qual eu posso contar hoje em dia, é com o sofá e a família que sempre se reúne ao redor dele. Já é a tradição daqui de casa.
            Quer dizer, só perde para aquelas noites na sacada.

Comentários

  1. SENTI UM EMBARGO QUANDO DISSE QUE SENTE FALTA DAS LEMBRANÇAS DO PASSADO...TE DIGO QUE TEVE SIM MUITAS FOTOS E MUITOS BONS MOMENTOS...E TE DIGO MAIS, SENTAR NO SEU SOFÁ É TUDO DE BOM!!!!TE AMO!

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