Alguém
me quebrou. E um dos
motivos pelos quais eu ando evitando escrever, também serve para explicar
porque eu ando evitando sentir certas coisas. E como escrever invariavelmente
envolve enfiar uma faca no coração e torcer até que as palavras que vazem dele formem algum sentido, eu
tenho tomado um pouco mais de cuidado mediante os meus passatempos masoquistas
ortográficos. Porque, pior do que admitir que alguém me quebrou, seria sentar e
escrever sobre isso. Mas já é Domingo à noite e as expectativas para transformar
este prelúdio à migração para o sofá, colocar um filme qualquer e adormecer em
frente à televisão já expiraram. Então por que não criar um pouco de adrenalina
para mim mesmo para pensar e sentir sobre você?
Particularmente, eu gosto de escrever para
você. “Você”, que pode ser qualquer
uma que vaga aleatoriamente pela órbita das minhas neuroses. “Você” que, apesar de ter um nome de
verdade e, suspeito, um coração de mentira, ainda é capaz de causar um pouco de
calafrios só de lembrar que esta reação é diretamente proporcional à alegria
ansiosa que eu tinha por me permitir atribuir sentimentos ao seu nome de
verdade e seu coração sincero, até então. “Você”,
cuja lembrança terrivelmente agridoce, atemporal e absurda ainda me serve de
inspiração para desviar dos instintos de desistência e desolação de um Domingo
à noite. “Você”, que eu não pretendo
relevar o nome próprio que possui, mas que secretamente tira um tempo da sua
rotina deslumbrante para passar os olhos em minhas palavras para saciar seu
apetite constante por uma plateia. Acontece que desta vez eu não estou falando
de nenhum desastre em particular, mas de um padrão crescente em proporções geométricas
de desilusão.
Não foi alguém em específico quem me quebrou
porque desde quando consigo me lembrar, não houve apenas uma mulher que passou
por mim como um tsunami e deixou para trás uma devastação por completo. Pelo
contrário, cada uma delas foi como uma peça de dominó postas em uma sequencia
perfeita, até um descuido fazer com que a cadeia inteira despencasse sobre mim.
E a partir disso surgiram comportamentos padrões, gostos específicos e trilhas
sonoras que, ao serem alinhados em um círculo vicioso, sempre acabavam da mesma
maneira: comigo, decepcionado, recolhendo as peças caídas no chão.
Eu ando tão focado em manter uma das peças
de pé que sempre acabo me surpreendendo quando ela acidentalmente cai e
consequentemente derruba todas as outras em seu alcance. Mas isso só acontece
porque, em se tratando de relacionamentos, eu ainda continuo procurando as
peças certas para serem colocadas nos lugares certos, na forma da garota certa
que não existe e do modo certo como deveríamos nos conhecer. E por mais que
essa sequencia não se firme de pé, eu persisto. Isto é, até o dia em que eu
desisti de recolher as peças e abandonei o jogo.
E a partir do momento em que eu me percebo
gostando de alguém, os padrões se repetem perfeitamente como quem posiciona as
peças tortas de dominó de pé somente para que se derrubem novamente. Eu gosto
de você, mas não sei como demonstrar isso. Guardo para mim, porque sinceramente
acredito que você não deve sentir o mesmo. Até que um dia você finalmente
descobre; talvez porque eu criei coragem para te dizer, ou porque o som das
peças tortas sendo derrubadas chamou a sua atenção. E você me diz que já tem
outra pessoa, ou que não há química entre nós, ou que eu simplesmente não sou a
peça que falta na sua própria sequencia. E quando os dominós desabam, eu apenas
as empurro para fora da minha vista e procuro outro jogo para me distrair.
Nunca considerando a possibilidade de que talvez eu esteja posicionando as
peças erradas, ou que cadeias de dominós em pé mais cedo ou mais tarde surtirão
seu efeito ao ruírem em colapso.
O segredo não está em rearranjar as peças,
ou nos espaçamentos entre elas. Em outras palavras, não adianta esperar
resultados novos ao continuar tentando encaixar relacionamentos em padrões
fracassados. Coisas como esperar para ver quem fala ou liga primeiro, ou
resistir para não admitir que está atraído por ela por medo de que tudo o que
vocês já construíram não resista à queda, ou apenas tropeçar e destruir
sequencias de sentimentos por receio de que vocês não se encaixem como deveriam
é o que nos deixa ansiosos por ver as peças tremerem, ou incapazes de tentar
reconstruir algo com alguém. E definitivamente, não existem as peças certas ou
os lugares certos, assim como não existem as pessoas certas e as sequencias
certas em que devem se colocar para não desabarem.
No fim somos todos incertos e frágeis como
peças de dominó postas de pé uma ao lado da outra, e sempre haverá o risco de
que um gesto em falso venha a afetar outras peças, outras pessoas e outras
estratégias por perto. E quando padrões de sequencia simplesmente não resistem
apesar da persistência, o melhor a fazer é procurar outra maneira de manter
nossas peças de pé e os nossos relacionamentos, estáveis. Talvez ninguém tenha
me quebrado ao ponto de me convencer a desistir do jogo; talvez eu só tenha perdido
o equilíbrio e esteja com receio de tentar de novo. Minhas mãos tremem só de
pensar em tentar colocar duas peças de pé em sequencia, ou de tentar segurar a
sua mão quando andamos lado a lado. Mas são pequenos jogos que insistimos em
participar, visto que o prêmio em consideração parece atraente demais para se
abandonar. É isto, ou passar o Domingo à noite cercado de peças espalhadas pelo
chão e ninguém para me ajudar a colocá-las em pé novamente. E não é algo que eu
espero que “você” entenda.
A vida é muito curta, e eu certamente não
quero passá-la tentando colocar peças tortas de pé em vão e escrevendo seu nome
entre aspas. E foi assim que eu silenciosamente quebrei meu padrão.
Comentários
Postar um comentário