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23


   Ontem foi 23. Foi o dia mais esperado por mim a cada ano que passa, cada inverno que eu sobrevivo e cada grade curricular que eu completo. Mas ontem foi diferente, porque provavelmente foi a última vez em que o meu aniversário envolveu abraços nos corredores da faculdade, ou um grupo de amigos tão grande para se convidar para sair e beber depois da aula. Não. Ontem os 23 foram definitivos em muitas coisas; encerrou o ciclo vicioso e trágico em que os meus 22 haviam se estagnado, entre empregos que vieram e se foram, e mulheres que parecem só ter ido embora, mas também definitivo pelo contexto em que eu sobrevivi por mais um ano. Porque os 23 prometem ser diferentes – como o primeiro ano em que eu estarei saindo para o mundo por conta própria, em busca de sucesso, felicidade, prosperidade e, quem sabe, um pouco mais de estabilidade para firmar as neuroses que, ao que parece, jamais abandonarei.
   Eu ainda não sei o que vou fazer com os meus 23, mas pela primeira vez isso não me assusta tanto. Se tem uma coisa que eu aprendi este ano, e que será o que levarei comigo daqui em diante, é que resiliência não é só uma palavra bonita que serve para impressionar pessoas em conversas de bar. Resiliência é uma necessidade; uma habilidade que a gente precisa desenvolver a cada dia, porque nada nesta vida dura pra sempre. Empregos se iniciam e terminam, relacionamentos podem evoluir ou implodir no piscar de uma foto postada no Facebook, famílias podem se reunir para almoçar no Domingo ou brigar e jurar nunca mais conversar uns com os outros só porque tal candidato ganhou e outro perdeu, e amigos podem nunca mais querer olhar na sua cara só porque você deu pra trás de sair em uma sexta-feira à noite. Algumas coisas ficam, persistem, perduram por um pouco mais, mas tudo eventualmente acaba. E como você vai enfrentar o fim dos seus ciclos quando eles se esgotarem?
   Quanto a mim, eu me rendo à minha velha e nostálgica noção de que só tenho a agradecer pelos 22 anos que tive até antes de ontem. Pelas pessoas que conheci e que deixaram em mim um pouco de si, independente se lembro delas com carinho ou com cicatrizes latejantes. Agradeço pelos lugares que conheci, que visitei e que ainda espero rever, mas que meu salário flutuante ainda não permite que eu planeje tantos sonhos a longo prazo. Agradeço por tudo que tive a oportunidade de fazer, e por finamente entender porque deixei outras chances passarem em branco por mim para irem embora com o vento. Eu também sempre fui muito devoto da teoria de que as coisas que dão certo, eventualmente darão mesmo certo. E que se não deu, mais pra frente a gente vai entender. Por exemplo, agora eu entendo porque aquela telha caiu, ou porque aquele estágio acabou, ou porque aquele carro quebrou no meio da estrada, ou porque você foi embora. São aprendizados que a gente precisa ter, mas que não necessariamente significa que iremos tê-los por bem. Às vezes é por mal, porque só assim a gente vai se lembrar deles.
   Ao contrário do que meus costumes me inspiram a fazer, eu não tenho muito a escrever. Na verdade, ainda não tenho as palavras certas, mas também não quero deixar que a minha procrastinação sirva de eclipse para todos os agradecimentos que fiz ontem e que já escrevi hoje para as pessoas que se importaram o bastante para me desejar um dia feliz. Independente se você se importa comigo, ou participa da comédia da minha vida, ou simplesmente viu por reflexo que era aniversário de alguém na coluna lateral do Facebook, muito obrigado.  São dias como ontem que me fazem engolir toda a minha baboseira sobre desejar dias melhores, porque eles já estão aqui. Só no último mês eu apresentei palestras, trabalhos, viajei um monte, passei tardes, noites e madrugadas conversando e rindo com meus amigos, fui padrinho de um casamento perfeito, trabalhei alucinadamente ao ponto da minha exaustão me fazer perceber que meus esforços valem a pena, e aprendi a sorrir surpreendentemente bem para as minhas fotos de formatura. E então chegaram os 23, com todos os abraços, felicitações, presentes, cartas e alegrias possíveis.
   E o que me resta agora é sair e descobrir no que vão dar esses 23. É claro que algo vai dar errado – muita coisa, provavelmente. Não sei se mais alguma coisa vai cair na minha cabeça, ou se vou ter o meu coração partido de novo. E ainda bem que eu não sei, porque eu também preciso aprender a aceitar as surpresas que me aparecem, em vês de estragá-las com a minha presunção. Então é isso, Igor: você vai envelhecer com graça? Ou vai envelhecer sem cometer erros?

   23. E lá vamos nós de novo.

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