Eu tinha uma música para você.
Na verdade, eu tinha uma coletânea inteira.
Dos hits para dançar até as mais lentas para usar como desculpa para chegar
cada vez mais perto de você. Colocando sutilmente as minhas mãos ao redor da
sua cintura, deixando o ritmo nos levar por si só.
Eu soube de um café no centro da cidade que
iríamos conhecer juntos. Sempre passo por lá mas nunca entrei para
experimentar. Achei que fosse justo a sua cara: reconfortante, acolhedor,
clássico. Parecia um lugar especial para chamar de nosso.
Na minha cabeça ensaiei o que diria aos seus
pais quando os conhecesse pela primeira vez. Porque você sempre me dizia o
quanto eles significavam o mundo para você, e tudo o que eu queria era fazer
parte disso.
Nas minhas andanças pela cidade que fiz ainda
sem segurar a sua mão, vários outros planos me vinham à mente; como aquela
pequena adega onde eu encontrei o melhor Pinot
Noir que já havia provado, e pensei no quanto ele seria perfeito para uma
das nossas noites preguiçosas de inverno em casa, com as janelas fechadas e
embaçadas e os cobertores quentes e irresistíveis. Você iria escolher o filme;
eu tentaria fazer a pipoca. E quando percebesse que o cheiro de queimado da
panela estivesse passando dos limites, iria achar graça de mim e deixaria isso
pra lá. Afinal, nós acabamos de jantar. “Deixe
o vinho respirar...”, você diria – dando a entender que estava mais afim de
que perdêssemos o fôlego juntos.
Outro dia passei em frente àquela
floricultura a caminho de casa e resolvi entrar. E pedi por tulipas brancas,
que você sempre deu pequenas “indiretas”
sobre serem as suas favoritas. Seria uma surpresa legal chegar em casa com elas
assim, sem motivo. “Que dia é hoje? Pra
que isso?”, você perguntaria sem entender. Você era como eu; sempre
questionando um gesto de carinho antes de aceitá-lo. Não estava acostumada a
receber carinho, muito menos sem justificativa. E ainda levariam anos para que
você se permitisse acreditar no que eu responderia: “Porque você merece.”
Eu admito que quando seus amigos sugeriram
que nos encontrássemos naquele lugar, eu não estava totalmente de acordo. Mas
primeiras impressões são importantes, e você queria tanto que eu os conhecesse
– ainda mais, depois de ter se dado tão bem com os meus que, depois de poucos
minutos, pareciam estar conversando como se fossem da mesma turma há anos. Tudo
bem, deixe eles escolherem o lugar. Só continue segurando a minha mão.
Mas quando tivemos aquela mesma briga sem
sentido pela milésima vez, o silêncio tomou o lugar das risadas. A distância preencheu
o que costumava ser intimidade. E quando eu percebi o seu olhar distante,
melancólico – quase trágico para quem soube um dia o quanto você era feliz – eu
tive que perguntar; “O que mudou?”
“Ausência.”
Talvez eu não fosse o bastante. O que te faltava,
eu não sei. Mas você não era mais minha. Você não iria voltar, e eu
provavelmente nunca entenderia o porquê. Você precisava de mais; talvez de
outro cara, talvez do mundo. E talvez nada disso ainda deixaria você
satisfeita. E talvez você nunca tenha sido minha. E os meus apelos, os meus
carinhos, as minhas constantes tentativas de provar que nós deveríamos ficar
juntos, foram as maiores provas das nossas inseguranças. Porque você e eu
sabíamos, lá no fundo, que você não iria ficar. Ou, que não queria ficar.
Éramos dois seres faltantes em constante
negação. Você queria mais do que tudo; eu queria sentir que o que tínhamos era
o bastante. Faltou limite. Sobrou saudade. E seja lá o que procuramos, que nem
sabemos descrever ou nomear, talvez não encontraremos juntos.
Obrigado por tudo. “Eu desisto.”
E de todas os ritmos e melodias, esta não era
uma música que eu havia guardado para você.
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