O que provavelmente foi o momento mais marcante que poderia
simbolizar os meus seis anos morando em Cascavel, foi aquele que vivi antes
mesmo de chegar aqui. Eu me lembro de encher o carro do meu pai com a minha
mudança, de andar até a porta do carro e de esticar a mão para abri-la, até que
algo me impediu. E por um instante eu fiquei ali, parado e pensativo, até que
me virei para o meu pai e perguntei:
- Isso vai
dar certo, pai?
E foi aí que meu pai suspirou fundo, revirou
os olhos e levantou as sobrancelhas com sincero cansaço, e deu a resposta que
serviria para estabelecer o tom de toda aquela mudança de vida que eu estava
fazendo:
- Entra logo
no carro, Igor.
É. Eu deveria ter desconfiado desde então que
era assim que o mundo real ia ser.
***
Seis
anos atrás, tudo o que eu queria era que acabasse logo. Aquela faculdade,
aquela estranheza, aquela saudade imensa que eu tinha de tudo que até então
configurava a minha pequena e infame vida adolescente. Eu havia decidido mudar
sim, ninguém me obrigou, e foram por vários motivos. Mas assim como meu
passado literário já havia previsto, eu sempre tive mais maestria com meus
começos e meus desfechos, jamais com o interlúdio. Porque eu achei que jamais
iria gostar tanto daqui como havia me apegado à Londrina; as ruas não eram nada
familiares, o clima era frio e as pessoas pareciam distantes. Ou então era só
eu quem estava se sentindo deslocado demais. Da maneira que um adolescente que
tomou sua primeira decisão importante na vida provavelmente deveria se sentir
mesmo.
Eu me lembro de virar para um dos meus amigos
na sacada da sua casa, dias antes de me mudar, e de choramingar para ele:
- Cara. Eles
vão me odiar lá.
- Claro que
não. Logo você vai encontrar um grupinho só seu igual fez aqui. Só não vai ser
da noite pro dia...
- É. Talvez...
Nada acontece da noite pro dia. Eu sabia
disso, mas não acreditava o bastante. Na verdade, acho que eu não tinha
paciência o bastante. Sempre fui mais impulsivo do que estratégico nas minhas
decisões. O que explica perfeitamente o porquê de eu tomar tantas decisões
infames e, mais vezes do que deveria, acabar provando ter mais sorte do que
juízo. Assim como, 99% das vezes, falo sem pensar e me arrependo. Talvez você
não saiba disso, porque aconteceu de que o que eu disse serviu para te ajudar
de alguma maneira. Mas acredite; foi sem pensar e eu me arrependo. Isso não
muda o fato de que eu não tenho, nem nunca tive filtro quando se trata das
minhas opiniões. Muito menos, ao extravasar a minha criatividade. O que, por
sua vez, explica porque este blog existiu.
Cada texto era como uma migalha que eu
deixava para trás, para tentar não me perder no caminho que eu nunca soube ao
certo como seguir, mas que de alguma maneira acreditei cegamente de que me
levaria exatamente aonde eu deveria chegar. E antes que você me diga alguma
coisa, eu sei: isso não faz o menor sentido. Nunca fez e especialmente agora,
depois que as decepções me diminuíram consideravelmente e de um leve ar de
maturidade que a barba por fazer me trouxe, isso ainda não faz sentido. Mas
ainda me dá esperanças para que amanhã seja melhor. Não que hoje não tenha
sido, mas é a mesma sensação que eu tive quando me impedi de entrar no carro do
meu pai há seis anos: aquela fase da minha vida, o fim do ensino médio, a casa
da mamãe e da vovó, as tardes despreocupadas com os amigos e uma vida tranqüila
de adolescente, havia sido incrível. Mas acho que já havia dado o tempo que
deveria durar. Talvez existisse algo além daquilo que eu precisava correr atrás.
E talvez o que eu procurava não estivesse em Londrina.
Foram mais de seiscentas postagens, cada uma
envolvendo alguma emoção que eu precisava emoldurar com meus parágrafos e
travessões, independente se estivessem coesos o bastante ou se carregariam algum
significado para qualquer pessoa além de mim. Eu cresci com isso, sobrevivi com
isso, e adorei cada vírgula disso. Relembrando até mesmo todas as vezes que
dediquei esta página a outras pessoas, não há nada que eu realmente queira
deletar; tudo foi importante e, por que não?, infinito enquanto durou. O que me
deixou pensando muito nesses meus últimos dias como cidadão Cascavelense: o que
teria sido de mim se eu não tivesse mudado?
O que teria
sido de mim se eu não tivesse conhecido você?
É, você. Que por algum motivo está lendo isso
agora, assim como já leu outros textos antes, ou que talvez até mesmo tenha
estrelado algum deles. Você ajudou a mudar a minha vida de alguma maneira, e o
que teria sido de mim sem isso?
***
Isto vai terminar exatamente como começou, e
ao contrário do modo como eu insisti em acreditar que a vida realmente
funciona: do dia pra noite. Às vezes eu me pego pensando em como cheguei até
aqui tão rápido, sendo que há
seis anos tudo o que eu mais queria era que isso passasse rápido.
Ainda bem que não é assim que as coisas
funcionam, e que pelo menos, ao meu ver agora, entre risos e prantos eu fui
mais feliz do que poderia imaginar. E que mais uma vez eu dei sorte ao decidir
sem pensar que esta parte da minha história teria este nome: “você vai adorar o
amanhã”.
Que fique registrado: eu adorei.
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