Pular para o conteúdo principal

Eu ♥ Foz do Iguaçu

*Escrito em 11 de março de 2016.

“Topofilia é descrita como um elo afetivo entre a pessoa e o lugar ou ambiente físico.”

Se for pelo calor, eu até entendo. É a primeira reclamação que qualquer pessoa que more ou que já tenha visitado Foz do Iguaçu fará sobre a cidade. “É insuportavelmente, constantemente, apocalipticamente calor!” e eu concordo. E por mais que eu idolatre o equilíbrio natural do Outono, esse calor imperdoável ainda não passou nenhum limite que realmente me motivasse a fazer as malas e abandonar toda a campanha de tentar fazer uma vida dar certo aqui. Mas o clima abafado mal é aceitável como tópico de conversa entre vizinhos que se encontram acidentalmente no elevador do prédio; quem dirá para uma completa mudança de endereço. Então eu fiquei pensando... Se não é estritamente pelo calor, por que algumas pessoas que moram em Foz do Iguaçu não gostam de Foz do Iguaçu?

É uma experiência que tive em primeira mão, ao fazer alguns contatos como parte da minha habitual tentativa de estabelecer qualquer vínculo com a cidade que adotei para mim, e que esperava que esta fizesse o mesmo através dos seus habitantes. Mas quanto mais pessoas eu conheci, e compartilhava com elas a minha história – que, convenhamos, merece seu caráter infame e desordenado muito antes de eu chegar aqui – menos elas conseguiam entender porque eu me mudei para cá. Por que eu não fiquei em Cascavel? Por que não voltei para Londrina? Por que eu simplesmente não fui para qualquer outro lugar?

Foram questões que pareciam tão simples de serem respondidas por mim, mas que de alguma maneira não satisfaziam a frustração de quem perguntava. Como se Foz do Iguaçu fosse o fim do mundo. E estas pessoas tecnicamente não estão erradas. Esta cidade é realmente um extremo do sul do pais, completa com saídas de emergência para dois países vizinhos. Em caso das coisas por aqui com a economia ou a política dificultarem demais a nossa permanência.

O relacionamento que você possui com sua cidade talvez seja o segundo mais importante que se possa ter. O primeiro, obviamente, sendo aquele que você tenta manter consigo mesmo. E algumas pessoas que conheci tratam Foz do Iguaçu da mesma maneira que tratamos o primeiro relacionamento que tivemos na vida. Como não conhecíamos mais nada, tudo era novo. E com o passar do tempo os mistérios foram solucionados e a rotina tomou conta. A cidade não era mais capaz de surpreendê-los, e seus limites foram se tornando cada vez mais evidentes. Tão evidentes neste caso, com suas fronteiras para o resto do mundo não tão distantes do centro, que já não era mais tão difícil imaginar uma vida nova fora daqui. Longe daqui. Em qualquer outro lugar que não fosse aqui.

É assim que costumamos tratar os primeiros relacionamentos que temos. As experiências que vivenciamos não se sustentam muito diante dos arrependimentos que arrastamos. E os bons momentos que tivemos são reprimidos de propósito, para não nos prenderem a um velho lugar comum por nostalgia ou consideração. Novo parece ser sempre melhor.

Mas existem pessoas que tem a sorte – ou a abençoada ignorância, dependendo do seu grau de incredulidade que já tenha atingido – de ter apenas um relacionamento que dura o resto da vida. E isso seria necessariamente ruim? Não é isso que a maioria de nós procura? Alguém que nos faça parar de procurar, deletar o Tinder e que ande de mãos dadas conosco no shopping?

Quanto a mim, infelizmente esta não é a minha primeira vez. Já tive outros relacionamentos antes, tanto com mulheres quanto com cidades, e por fim acabei abandonando todas em prol de algo que ainda estava faltando. Um sonho que parecia se deslocar toda vez que eu chegava muito perto de alcançá-lo. E então eu cheguei à Foz do Iguaçu. Uma cidade fronteiriça que apesar do seu calor e das suas ruas repletas de turistas confusos à procura do terminal central, parecia me remeter apenas uma coisa: mais do que uma terra de cataratas, esta é uma terra de possibilidades.

Dotada de uma interculturalidade que poucas outras cidades brasileiras possuem, a impressão que tive ao chegar até aqui e que ainda tenho todos os dias desde os últimos sete meses é que, se existe um lugar com inúmeras possibilidades por metro quadrado, e que de quebra é totalmente aceitável sentir-se perdido e pedir por informações para alguém na rua, esse lugar é aqui. Claro que as coisas não andam tão fáceis assim. Eu ainda não estou trabalhando, minha vida social resume-se ao horário das aulas na faculdade, e o amor.... Ainda está preso em uma frase estagnada por reticências. E faz calor. Meu Deus, como faz calor!

***

Eu realmente me recordo dos meus antigos relacionamentos com outras cidades com muito carinho....

- Eu ♥ Londrina (escrito em 04/10/2010)
- Eu ♥ Cascavel (escrito em 10/03/2011)
- Eu ♥ Cambé (escrito em 03/10/2011)

...mas não, eu não voltaria para nenhuma delas. E acho que já chega de tantas mudanças... Está na hora de assumir um compromisso sério.

***

Eu não amo Foz do Iguaçu. Ainda não, pelo menos. Mas há potencial com certeza. Londrina foi meu primeiro amor, e por isso sempre será lembrada com um carinho moderado pelos erros que cometi por falta de experiência. Cascavel foi um relacionamento turbulento, mas que terminou do meu jeito e que ainda me dá saudades muito saudáveis do nosso tempo junto. Agora, Foz do Iguaçu e eu ainda estamos nos conhecendo. São sete meses de primeiras vezes constrangedoras e desentendimentos irracionais. E ela é esquentadinha demais para o meu gosto. Mas que relacionamento não tem suas dificuldades? Apesar disso já temos muitas histórias para contar; histórias que não só continuam me inspirando a escrever sobre elas, mas também a continuar aqui em busca dos meus objetivos.

Por mais que faça calor, e que as ruas sejam cheias de estrangeiros desorientados, e não exista uma definição exata de onde é o “centro” da cidade, é importante ter um bom relacionamento com o lugar onde você mora. Nem que seja pelo simples fato de que, por ora, nenhum de vocês vai a lugar algum.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Os 5 estágios do Roacutan

            Olá. Meu nome é Igor Costa Moresca e eu não sou um alcoólatra. Muito pelo contrário, sou um apreciador, um namorador, um profissional em se tratando de bebidas. Sem preconceito, horário ou frescura com absolutamente nenhuma delas, acredito que existe sim o paraíso, e acredito que o harém particular que está reservado para mim certamente tem open bar. Já tive bebidas de todas as cores, de várias idades, de muitos amores, assim como todas as ressacas que eram possíveis de se tirar delas. Mas todo esse amor, essa dedicação e essas dores de cabeça há muito deixaram de fazer parte do meu dia a dia, tudo por uma causa maior. Até mesmo maior do que churrascos de aniversário, camarotes com bebida liberada e brindes à meia noite depois de um dia difícil. Maior do que o meu gosto pelos drinques, coquetéis e chopes, eu optei por mergulhar de cabeça numa tentativa de aprimorar a mim mesmo, em vês de continuar me afogando na mesmisse da minha mela...

A girafa e o chacal

Melhor do que os ensinamentos propostos por pensadores contemporâneos são as metáforas que eles usam para garantir que o que querem dizer seja mesmo absorvido. Não é à toa que, ao conceituar a importância da empatia dentro dos processos de comunicação não violenta, Marshall Rosenberg destacou as figuras da girafa e do chacal . Somos animais com tendências ambivalentes – logo, nada mais coerente do que sermos tratados como tal.  De acordo com Marshall, as girafas possuem o maior coração entre todos os mamíferos terrestre. O tamanho faz jus à sua força, superior 43 vezes a de um ser humano, necessária para bombear sangue por toda a extensão do seu pescoço até a cabeça. Como se sua visão privilegiada do horizonte não fosse evidente o suficiente, o animal é duplamente abençoado pela figura de linguagem: seu olhar é tão profundo quanto seus sentimentos.  Enquanto isso, o chacal opera primordialmente pelos impulsos violentos, julgando constantemente cada aspecto do ambiente ...

Wile E.: o gênio, o mito, o coiote

Aí todo mundo no Facebook mudou o avatar para a imagem de algum desenho e eu não consegui achar mais ninguém, mas depois de um tempo eu resolvi brincar também. O clima de celebração do dia das crianças invadiu as redes sociais de tal maneira que todos nós acabamos tendo vários flashbacks com os desenhos de nossos colegas, dos programas que costumávamos assistir anos atrás quando éramos crianças e decorar o nome dos 150 pokemons era nosso único dever. E para ficar mais interativo, cada um mudou a imagem para um desenho com qual mais se identifica, e quando a minha vez chegou, não tive dúvidas para escolher nenhum outro senão meu ídolo de ontem, de hoje, e de sempre: o senhor Wile E. Coiote. Criado em 1948 como mais um integrante da família Looney Tunes, Wile foi imortalizado pelo apelido e pela fama de fracassado em sua meta de vida: pegar o Papa Léguas. Através de seu suposto intelecto superior e um acesso ilimitado ao arsenal de arapucas fornecidas pela companhia ACME, Wile tento...