Entre
todas as coisas das quais eu sinto falta
nesta vida, o vazio que mais me entristece é aquele com o meu próprio formato.
Tem dias em que o eco da pessoa que eu costumava ser tão soa tão alto ao ponto
de me incomodar, mas seu impacto sempre me encontra à noite, entre o momento em
que eu deito minha cabeça no travesseiro e a odisseia que se passa dentro dela
até a manhã seguinte. Aqui e agora não me refiro à eventual maturidade pela
qual todo mundo passa, conforme a vida adulta se encarrega de roubar o que nos
resta de inocência e despreocupação perante ela. Só quero dizer que... Eu não
sei. Algo vem acontecendo nos últimos anos, meses, semanas... Ou, melhor
dizendo, nada mais acontece. Nada mais me inspira, emociona, anima. Os dias,
assim como os problemas, vem e vão. E o que fica, sinceramente, não me parece
ser o bastante.
Eu não gosto de ser tão problematizador. E nem gosto de usar
palavras tão complicadas assim também. Houve um tempo em que a vida costumava
ser mais simples, mais leve... E a pessoa que eu costumava ser – a pessoa que
eu gostava de ser – parece ter morrido um pouco a cada dia que passou, e que me
trouxe até aqui.
A você que está lendo isto agora – é, você mesma – eu tenho
que confessar que sinto muito.
***
Gostaria que você tivesse me conhecido por inteiro, e não
quebrado do jeito que estava quando me encontrou. E eu sinto muito se, em
parte, quebrei você também. Às vezes quando se passa muito tempo sendo vitima
de eventos infortúnios e pessoas incompletas, não como evitar provocar este
mesmo efeito às pessoas que você conhece desde então. Claro que isto não é uma
desculpa para o meu comportamento, nem uma justificativa determinista para
apaziguar a minha consciência.
A verdade é que eu amei pouco você. Menos do que admitia
estar sentindo. Não por maldade ou falsidade. Eu só não sei amar. E parecia bem
mais fácil abandonar você, julgando que você também não sabia, do que admitir a
realidade. Quem não sabe amar, também não sabe reconhecer quando é amado.
E se eu te mandei embora, e desapareci... Bom, isto é só
mais um sinal de quem eu sou agora. Quem eu costumava ser jamais mandaria
alguém embora – não ao menos sem uma explicação. Mas pessoas em quem eu
confiava, e até mesmo amava, desapareceram da noite pro dia para mim. E a
herança que deixaram, no abismo das suas reticências, foi a noção de que isto é
normal. Desistir é normal. Desapegar é aconselhável. Dar uma segunda chance é
impensável. Criar expectativas é o começo do fim.
Não gosto desses valores, nem do efeito que provocaram na
minha vida de uns tempos e pessoas pra cá.
De vez em quando você precisa se perguntar, “quem sou eu agora?” E se a resposta te
impedir de dormir à noite, algo precisa ser feito. Eu não sei o que farei ainda
– “mudar” parece abstrato demais para
ser prometido, sem ter ao menos um plano em mente. Mas o status quo não é mais uma opção. Inércia não deve fazer parte do
meu vocabulário. E não há nada de ridículo em sorrir em fotos ou deixar de
franzir a testa ao escutar algum absurdo.
O objetivo disso tudo não é ser feliz? Por que eu fujo tanto
disso então?
Ah, disso eu me lembro. Me disseram que eu não era capaz de
sossegar. Que ser inquieto, neurótico, inconstante e destrutivo fazem de mim
quem eu sou. Só para jogar na minha cara logo em seguida que a mulher da minha
vida – a mulher com quem eu sonho, para quem eu escrevo e por quem eu choro –
não existe. E o dia em que eu comecei a morrer foi quando comecei a acreditar
nisto. Dia após dia, ano após ano, decepção após decepção, eu desapareci.
Não é só você quem sente a minha falta.
***
Isto é só um texto. O último por um tempo, até que eu
consiga recuperar meu fôlego. E quem sabe, se eu tiver sorte, também consiga
recuperar um pouco de quem eu costumava ser também. Porque se você foi embora,
certamente teve seus motivos. E a minha parcela de responsabilidade está entre
eles. Se há alguma chance de aprender a amar, perdoar e dar segundas chances,
preciso começar comigo mesmo. E pra ser sincero, isto é algo que eu também
recomendo a você. Todos nós temos os nossos defeitos, mas foi preciso duas
pessoas para fazer com que “nós”
também deixasse de existir.
Quem é você agora?
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