Tudo começou com uma ressaca. A sensação de que a noite anterior não havia terminado ainda, mas na forma de leves dores de cabeça, uma vontade insaciável por líquidos que não possuíssem o mesmo teor alcoólico de todas as bebidas pelas quais eu passei, e um cheiro intragável de tabaco que demorou dias para que eu deixasse de senti-lo nos meus poros. Foi uma típica sexta-feira à noite, para falar a verdade: sair com amigos para um dos tantos barzinhos da cidade, com direito a alguns copos a mais de cerveja e uns cigarros para ajudar a liberar toda a carga de estresse que se instalou durante a semana. A pressão do trabalho, a correria da faculdade, as obrigações domésticas, e as neuroses usuais sobre não ter dinheiro o suficiente no bolso, nem aquela “alguém especial” da vida. Nada que eu já não tenha vivido milhares de vezes antes.
Só havia um porém: eu não tenho mais 17 anos. Longe disso; os 25 estão me encarando cada vez mais de perto. O que explica a primeira ressaca que tive em anos – talvez voltando até às festas que frequentava aos 17.
As outras pistas sempre estiveram bem evidentes; eu só estava bem confortável na interminável negação. Interminável, mas não atemporal. Eu me lembro até hoje do primeiro cabelo branco que encontrei na minha cabeça. Ironia ou não, mas também foi aos 17. O que me faz concluir com grande pesar que os momentos de estresse, neurose e paranoia não são só momentos – são quem eu realmente sou. Estes, dentre tantas outras coisas, compõem a minha tal personalidade.
Se aos 17 é quando começamos a tomar nota de quem somos nesta vida, aos 25 a conta chega. E eu não sei se consigo cobri-la.
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Aos que ainda não alcançaram a casa dos vinte, eu digo: continuem aproveitando. A festa não pode parar. Eu também sinto muito, mas essa conversa não vai rolar entre nós. Isso é papo para quem, assim como eu, se obrigou a dar um tempo das multidões, das batidas fortes de música que quase estouram as caixas de som, e das preocupações pequenas sobre “por que ela não responde as minhas mensagens?”, para encontrar um canto tranquilo e recuperar o fôlego. Preferencialmente, sentado.
Eu nunca pensei muito sobre envelhecer. Talvez como todo carinha mimado pela juventude e pela imensidão que o horizonte ao seu redor ainda reserva para ele, não tenho mais vergonha de admitir que não fiz planos para quando chegasse até aqui.
Sinceramente? Eu sempre pensei que viveria para sempre. Imaturo. Inconsequente. Igor para sempre.
Não sei se é a questão da idade que me incomoda, mas o cansaço é tão inevitável quanto é imperdoável. Senão pelos outros, por mim mesmo - que ainda tento me obrigar a ficar acordado por mais horas do que meu corpo já consegue aguentar, porque sou (teoricamente) jovem e são só onze horas. Tem gente que a essa hora ainda está se arrumando para sair de casa, e eu aqui: afundado no trágico conforto de calças de moletom, meias com chinelo e uma caneca de chocolate quente. Se é sexta, sábado ou domingo à noite, não faz mais diferença. Ao contrário do tempo em que ficar em casa em pleno sábado à noite era considerado um tapa na cara do meu eu do futuro, que certamente iria se olhar no espelho e pensar em todas as noites desperdiçadas, todas as oportunidades perdidas, enquanto evita sequer rever a coleção de arrependimentos que juntou ao longo dos finais de semana dentro de calça de moletom.
E como se não fosse o bastante, ainda acordo cedo no dia seguinte. Mais tempo para enlouquecer.
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Em caso de crises existenciais, melhor não fazer nenhum movimento súbito.
Eu costumava me sentir mais vivo. Ou no mínimo, mais participativo. Nem sempre as noites eram animadas ao ponto de que eu me sentisse contente sobre o quanto estava aproveitando a minha juventude. Mas ainda se salvavam pelo esforço, coisa que eu pareço ter abandonado. Claro que tudo isso pode só ser uma fase. Segundo tudo o que já procurei ler, e baseado no meu próprio estado de espírito que move-se naturalmente da melancolia à sua programação normal em questão de dias e músicas, eu acho que ficarei bem. Até porque, já me sinto bem melhor do que estava durante os primeiros parágrafos deste texto.
Talvez porque, ao contrário da opinião geral que costumo tirar da minha vida atualmente, este texto encontrou seu propósito e tornou-se melhor por isto.
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Já me pego falando com um tom de voz endurecido por todos os arrependimentos que já carrego comigo nesta vida, e deixando escapar frases como “no meu tempo”, “na minha época” e “quando eu passei por isso...”. Me vejo no espelho com a face cada vez mais ecoando os traços do meu pai, e meu corpo reproduzindo os trejeitos do meu avô, enquanto aviso minha irmã mais nova para se cuidar ao sair de casa para mais uma festinha com as amigas, e aconselho meus amigos que ainda não alcançaram a casa dos 20 que nunca é cedo o bastante para viver sem se preocupar com o que os outros vão pensar. Seja você mesmo, não importa o que isto implique.
Se você precisará conviver consigo mesmo até o fim, que seja no mínimo sincero sobre o que você significa. E acho que isto vale para mim também, que falo e escrevo como se estivesse em meu leito de morte, prestes a me despedir deste mundo. Ainda há muita vida em mim, eu sei. Eu só ando bem, mas bem cansado...
Reflexos da noite passada, ou talvez de todos os anos que vieram antes dela. Sem dúvida alguma, a pior ressaca é a que o tempo causa.
*Escrito em 11 de setembro de 2016.
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