A pessoa
certa não existe. Sendo assim este texto já poderia terminar, mas antes
gostaria de desenvolver meus argumentos. Nem que seja para evitar reverter
minha opinião na apelação – do resto do mundo, nesse caso, quando algo ou
alguma coisa se disfarçar de sinal de que estou errado. Mas assim como ninguém
em sã consciência explica um relacionamento, nada justifica definir alguém como
a pessoa certa. O tal amor da sua vida, como eu sempre costumava dizer.
Seguindo a lógica, essa figura mitológica só se revelaria no seu último
suspiro, certo? Você sente uma pontada no peito, exclama “era ela!” e morre.
Mas eu posso estar errado.
Tampouco
produtivo é passar o tempo questionando sobre quem viria a ser a pessoa certa.
Como se a vida não passasse de um filme de suspense onde, no final das contas,
há um casamento no lugar de um homicídio. Há até quem diga que tais
acontecimentos são mais sinônimos do que parecem.
Depois de
anos à procura de algo que nunca encontrei, é fácil render-se às leviandades da
vida. É nessa mesma metáfora, inclusive, que grandes pensadores do mundo se
esbarram sem querer – como Zeca Pagodinho e Zygumunt Bauman bebendo juntos num
bar, brindando às lamúrias da existência que consolidaram suas obras. Da
modernidade líquida ao deixar a vida te levar, tudo parece se resumir mesmo a
um happy hour ao som de pagode dos anos 90.
O que eu
quero dizer mesmo é que não existem argumentos fortes o bastante para eleger
uma única pessoa certa entre todas as que você irá conhecer. Uma constatação
que, ironicamente, não exclui o quão erradas outras tantas serão pra você. É
tudo uma questão de tempo e deslocamentos o suficiente para te empurrar adiante
na vida e enxergar a figura maior com mais clareza: as pessoas não são metades
de uma laranja, peças de um quebra-cabeça ou sonhos que se tornaram realidade.
Ainda que possam parecer ácidas, fragmentadas e possam provocar insônia na mesma
proporção.
O que
existem de fato são duas pessoas ligeiramente erradas que fazem de tudo para
dar certo – o resto são cenários, figurantes e barulho de fundo. Dito isso,
porque a noção de que alguém mais que perfeita poderia aparecer na nossa vida e
fazer com que nos arrependêssemos da nossa escolha? Talvez o problema – e a
resposta – residam na nossa própria linguagem: é muito fácil se confundir entre
tantas regras da linguística e, convenhamos, ninguém usa nada no pretérito mais
que perfeito. Você que está lendo nem sabe se tenho razão e, só pra provar que
estou errado, deixou de ler para ir pesquisar. E é essa a questão: nenhum de
nós sabe o que está fazendo pra poder alegar que sabe quem é certo ou errado
pra si mesmo.
Talvez o
grande mal-estar da civilização, teorias freudianas à parte, esteja justamente
no quão fácil tornou-se questionar tudo e todos ao seu redor. Ou então:
cancelar tudo e todos ao seu redor quando o desagradam. Quando tudo parecer
raso ao seu redor, procurar aprofundar-se nos motivos para isso pode acabar te
afundando ainda mais na dúvida. Mas pode soar bem irônico vindo de mim: por
mais rasas que eu gostaria de pensar que as pessoas são, acho que me afogaria
nelas do mesmo jeito.
Enfim, é
isso que acontece com o tempo: ficamos profundos. Às vezes o bastante para
discernir por quem vale a pena nos movermos, às vezes mais do que o
aconselhável para só ser feliz onde estamos. E então você descobre que deixar a
vida te levar não era só um pagode, mas um enigma. Resta saber exatamente aonde
queríamos chegar – e com quem.
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