Isso pode ser reconfortante ou
desesperador – depende de como você encara as idas e vindas da sua vida.
Acho que em algum momento, todos nós fomos ensinados sobre como a vida corre em ciclos. Alguns se iniciam por iniciativa própria, outros são forçados a nós pela iniciativa de outros – e, claro, há aqueles que simplesmente se impõe em nosso caminho, sem consultar qualquer opinião.
Enfim, há quem teorize que as
idas e vindas da vida se manifestam entre esses ciclos – o que também ajuda a dar
sentido à distância que invade o espaço outrora preenchido por infinita
intimidade. É como aquela cena de abertura de novela, com gente chegando e
saindo a todo instante, numa frequência frenética de êxtase e melancolia.
Mas para quem já passou dos 30 há
algum tempo, acho que tenho tempo de casa o suficiente para contestar algumas
infames verdades universais. Porque quanto mais eu me distancio do mundo de uma
pessoa, em direção a outro, mais eu percebo como ninguém realmente some.
Pelo contrário: todos deixam
pegadas. Você decide se quer alcança-los ou não.
Essas pessoas tampouco se tornam fantasmas,
pois isso implicaria no fato de que elas não podem mais ser vistas – apenas sentidas,
em memória. Pode ser verdade em se tratando de uma partida específica, mas não
sobre todas as outras. Os que ainda andam entre nós podem ser vistos a qualquer
hora, mas aí voltamos às mazelas da intenção alheia e, claro, as correntes do
nosso próprio ego.
Tudo isso me veio à mente enquanto
o mundo parece estacionar naqueles dias estranhos entre o mundo novo e o antigo
– quando as luzes de Natal já parecem antiquadas e o ano novo ainda soa como
uma imagem embaçada. É tempo de fazer um inventário sobre tudo que passou por
você nessa última leva de meses e o que de fato conseguiu fazer ao longo deles.
E como é de se esperar, também é tempo de enfrentar o que Manoel Bandeira insiste
em ecoar na minha cabeça: a vida inteira que poderia ter sido e não foi.
Mas assim como um amor entre as
ruínas, sempre existe esperança a ser reencontrada em meio a promessas
desfeitas e metas inalcançadas. É nessa brecha em que passamos tanto tempo
esperando, sentindo, sonhando, que novas ideias tendem a surgir. A ironia, vez
por outra, é que novas ideias podem envolver velhos rostos – e enfim somos
atingidos pelo infame questionamento: por onde anda você?
A maior tragédia humana vive
dentro de cada um de nós em forma de constante contradição. Porque até mesmo as
pessoas que mandamos embora sabem como nos atrair. Afinal, é algo que plantaram
antes de descobrirem que não estariam por perto na hora da colheita. Mas a primavera
sempre chega para nos lembrar de que renovação, embora deveras necessária, é só
mais uma fase em um calendário. Um ciclo como todos os outros.
Quando digo que isso pode ser
reconfortante, talvez esteja falando com quem ficou. Agora, se parecer
desesperador demais, sei que estou falando com quem partiu. Mas a verdade é a
mesma para ambos: estamos todos vulneráveis à nostalgia.
Eu jamais me considerei
inesquecível, salvo por aqueles que insistem em existir na minha órbita. Por
bem ou por mal, é um alívio saber que esse talvez seja um dos poucos jeitos de
vivenciar os dois lados de uma escolha – mesmo envolvendo um grau de renúncia, os
que ainda estão aqui continuam à disposição, mesmo que não a deles mesmos.
Em clima de retrospectiva, talvez
o maior aprendizado seja mesmo entender e aceitar que ninguém realmente some.
Reencontros são inevitáveis e a conta das nossas desavenças sempre chega. Escolher
fugir é uma vitória momentânea enquanto não somos alcançados por nossas
próprias circunstâncias, mas há quem defenda que é preciso ganhar tempo antes
de confrontar certos lados da sua realidade – só nunca me pareceu tão eficaz
porque, convenhamos, quem de nós já esteve mesmo pronto para alguma coisa?
Antes de me despedir desse ano, é
preciso aceitar uma verdade ainda mais íntima: às vezes quem se esconde somos
nós, principalmente de nós mesmos. Se reencontros são iminentes, faz mais
sentido resgatar-se enquanto ainda sabe se reconhecer. Não é preciso ter mais
de 30 anos para entender o qual impiedosa a nossa memória pode ser, por isso tente
manter-se fiel a si mesmo enquanto pode. Ninguém nunca te entenderá como você
mesmo, e fazer as pazes consigo pode ser a maior de todas as vitórias. Ao menos
é nisso que eu pretendo me concentrar, indo adiante.
No final das contas, só existe uma
partida real. Todas as outras não passam de danças de cadeiras. Entre uma
música e outra, seja uma boa companhia a quem parar ao seu lado. E, sim, isso
inclui você mesmo. Pois assim como ninguém realmente some, ninguém nunca
conseguirá fugir de quem é. Entre idas e vindas, ciclos e calendários, é isso
que se leva daqui.
Até a próxima.
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