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A justificativa sem fim

45 anos atrás, Pink Floyd disse que não precisamos de educação e aqui estamos nós: aparentemente muito confortáveis com a nossa imprudência. Claro: não imaginávamos que um hino rebelde poderia nos deixar tão mal acostumados, e realmente não é de se culpar o hino - nem nada ou alguém na verdade - a não ser nós mesmos pelo estado da nossa cultura. O problema, como é de se esperar, mora na interpretação de texto - ou então, especificamente, no nosso jeito de ler e reproduzir o mundo à nossa volta, à nossa maneira, sob uma visão espetacularmente egocêntrica. Pelo visto Pink Floyd não percebeu que, ao tirar a educação da equação, também estava abrindo a porta para a insensatez sem limites. O que nos leva ao novo grande mal estar da humanidade (e outro sério problema acadêmico): a justificativa sem fim. Assim como Pink Floyd nos absolve da necessidade de qualquer educação ou controle de pensamento, passamos a admirar toda e qualquer instituição capaz de assumir a responsabilidade sobre noss...
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O complexo da maturidade (ou Depois de tudo que eu fiz por você, que você não pediu)

Por isso é tão importante dar nome aos seus sentimentos: é a única forma de não se render a eles. É a mesma lógica usada em “Invocação do Mal 2” – se você descobrir o nome do demônio, é possível enfrentá-lo e finalmente baní-lo. Mas estou me adiantando aqui; do que estávamos falando mesmo? Bom, é difícil dizer. Da última vez em que ouviu falar de mim, eu não estava tão ocupado ajudando a resgatar sentimentos alheios – longe disso, estava mais preocupado com os meus. Mas é isso que acontece quando você aceita que virar adulto não é uma escolha, é uma sentença perpétua à qual você está inevitavelmente condenado – não que isso seja de todo mal. Ser adulto tem suas vantagens como, por exemplo, dizer “não” sem qualquer sufixo ou justificativa.  Também é possível circular pra lá e pra cá a qualquer momento, desde que esteja dentro dos horários de atendimento. E, claro, somos o único público que garante sua participação em eventos, sejam eles pagos (16ª Feira de Queijos Importados de Lie...

Qual é o seu lugar?

“Às vezes você precisa perder tudo antes de realmente conseguir se encontrar.” Essa é uma das duas frases que carrego comigo há anos na forma de post-its em um mural improvisado. Mudança após mudança, o mural foi perdendo seu charme original, bem com os post-its perderam sua capacidade de se segurar nele. Se há ou não uma metáfora embutida nisso quanto a permanência das coisas, a natureza efêmera da vida ou o teste do tempo sobre a nossa determinação, eu não sei. Mas são pensamentos que não pude deixar de notar enquanto, mudança após mudança, eu passava meus post-its a limpo como forma de nunca me esquecer do que considero ser fundamental. Parece irônico precisar de um lembrete sobre algo fundamental, mas a vida – além de efêmera – também tende a ser deveras contraditória. Assim também se constitui a nossa natureza, apesar de alguns traços de personalidade constantes que, vez por outra, parecem destoar da realidade à sua volta. Não porque deixaram de nos representar, mas porque não faz...

Tudo está diferente (mas nada mudou)

“As coisas estão melhorando / ou você ainda se sente o mesmo?”  – “One”, U2 Mas isso era inevitável, não é? Vai levar um tempo para que tudo realmente mude. Ao contrário do mundo projetado pela união instável entre minha ansiedade e minhas expectativas, o sol que nasceu hoje não tende a iluminar grandes avanços. Pelo contrário: salvo uma ressaca ou outra em destaque, a tendência é que a vida continue a provocar as mesmas dores de cabeça de sempre.  Calma: isso não é o reflexo de algum instinto pessimista crônico. Acredite se quiser, mas isso é uma promessa. Talvez a mais otimista e generosa a passar pelos seus olhos hoje. Talvez já tenha acontecido com você: em menos de 24 horas, toda a fé que você depositou no universo acabou sendo implodida devido a algum descuido, esquecimento ou hábito – invalidando toda e qualquer nova atitude que você imaginava ter quando o relógio marcasse meia-noite.  É comum de esperar que a fundação do universo simplesmente se reconstrua num pas...

Ninguém realmente some

  Isso pode ser reconfortante ou desesperador – depende de como você encara as idas e vindas da sua vida. Acho que em algum momento, todos nós fomos ensinados sobre como a vida corre em ciclos. Alguns se iniciam por iniciativa própria, outros são forçados a nós pela iniciativa de outros – e, claro, há aqueles que simplesmente se impõe em nosso caminho, sem consultar qualquer opinião.   Enfim, há quem teorize que as idas e vindas da vida se manifestam entre esses ciclos – o que também ajuda a dar sentido à distância que invade o espaço outrora preenchido por infinita intimidade. É como aquela cena de abertura de novela, com gente chegando e saindo a todo instante, numa frequência frenética de êxtase e melancolia.   Mas para quem já passou dos 30 há algum tempo, acho que tenho tempo de casa o suficiente para contestar algumas infames verdades universais. Porque quanto mais eu me distancio do mundo de uma pessoa, em direção a outro, mais eu percebo como ninguém r...

Isto não é para lágrimas

Talvez o principal motivo pelo qual eu não me permita mais parar para pensar sobre as coisas seja o quão forte a realidade é capaz de me atingir agora. Claro que, por via de regra, essa viria a ser mais uma das ironias a enfeitar a minha coleção.   Pode parecer confuso para quem chegou agora, mas a verdade é que, em outros tempos, eu vivia para pensar – sobre tudo. E o que fazia para impedir que todos esses pensamentos pairassem sobre mim, sem forma? Ora. Dava a eles a moldura que eu senti que mereciam: textos e mais textos sobre os altos e baixos da minha vida, meticulosamente psicografados na esperança de que um dia serviriam a algum propósito.   Entenda: eu era jovem. Era outro mundo. As coisas eram mais simples e eu tinha muito mais tempo livre para... Bom, ser livre. À minha maneira, em mais palavras do que pareciam ser necessárias, mas sempre convicto de que escrever fazia sentido. Mais do que isso: fazia com que eu me sentisse vivo. Quem não cederia a um impul...

O paradoxo da piscina em casa

Eu fui uma criança de apartamento, o que em teste já deveria te dizer tudo que precisa saber sobre mim. Desde as pobres habilidades sociais – graças à arte de evitar vizinhos nas escadas – até a péssima coordenação motora – por ter preguiça demais para enfrentar as escadas rumo a qualquer espaço livre no térreo para praticar alguma atividade física. Mas meu prédio não era como os de hoje – completo com todas as áreas gourmetizadas possíveis, quadras de beach tennis e espaço pet. Longe disso; naquele tempo o ápice da vida verticalizada era ter um botão para controlar a entrada e saída da “porta de vidro” que separava o portão externo e os capachos dos moradores do primeiro andar. Naquele tempo eram raros os prédios com elevador ou algum atrativo na área comum. Por isso era sempre animador visitar algum amigo ou parente que morasse em uma casa cujo terreno permitisse melhorias como churrasqueira, uma rede pendurada entre pilares e, claro, uma piscina. Os meses entre novembro e fevereiro...