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A linha de chegada


            Muita coisa pode acontecer em quatro anos. Sonhos mudam, tendências vem e vão, prioridades são reavaliadas, e corações partidos podem voltar a bater de novo. Ou não.
            Quem me conheceu há quatro anos talvez tenha percebido algo diferente em mim ultimamente. A capacidade de falar em voz alta, de ter atitudes mais firmes e paixões menos platônicas são algumas que poderiam ser comentadas. Mas o que realmente me surpreende é exatamente o caminho que eu percorri até aqui; as cem lágrimas de distância que, há quatro anos, eu costumava cantar que existiam entre mim e a felicidade. E o quanto eu costumava contar meus passos no começo até algo acontecer. Algo que eu não sei dizer de fato o que foi. Foi quando me apaixonei à primeira vista por você, sem nem ter trocado duas palavras com você para isso? Foi quando eu comecei a conversar mais com você, e da noite pro dia passei a vê-la com outros olhos? Ou talvez tenha sido quando você foi embora e me quebrou de um jeito que eu nem imaginava ser possível? Ah, quem sabe tenha sido quando eu conheci você, só para descobrir que era possível sofrer ainda mais do que eu já tinha abstratamente sofrido. Quer dizer, até conhecer você. E você. Ah, e teve você também. Enfim...
            Ou então talvez não tenha tido nada a ver com amor, por mais que este seja o foco das minhas preocupações – ou falta delas – hoje. Talvez tenha sido quando eu fui morar sozinho, e aos poucos aprendi a abrir mão de Londrina e aceitar Cascavel, e a como transformar uma casa em um lar. Talvez tenha sido quando comecei a trabalhar, a receber um salário fixo mensal pela primeira vez, e a vivenciar a dor e o cansaço de uma carga horária excessiva que exigia mais de mim do que eu achei que era capaz. Quem sabe foi a faculdade, o motivo pelo qual eu me mudei e larguei a boa vida e tudo de familiar que eu tinha para trás, para aproveitar a chance de um recomeço em um lugar novo, em uma fase nova em que eu estava me matriculando. Ou então, foi a segunda vez que eu fiz isso, depois que Jornalismo falhou em me inspirar enquanto a Psicologia se encarregou de me acolher com o que até então para mim era viciante: uma visão subjetiva de mundo, onde tudo é possível e ninguém é igual a ninguém.
            O que mais eu encontrei nessa caminhada? Pessoas novas, amigos incríveis, lugares novos, lembranças inesquecíveis e saudade, mas muita saudade mesmo de coisas que ainda estão ao meu alcance no presente, mas que eu sei que não vão ser pra sempre. E nesse meio tempo eu comemorei aniversários, casamentos, formaturas, baladas, cervejadas, e tudo mais que um open bar nessas situações poderia me proporcionar. Mas também tive percalços. Pessoas se foram, momentos de incerteza às vezes reinaram, dificuldades pareciam ter vindo para ficar, enquanto minha teatralidade e meu drama chegaram ao ápice da sua existência, até finalmente serem extintos pelo tempo e o cansaço que eventualmente se acumularam sobre os meus ombros e o meu coração. E quando eu disse que era isso que me preocupa hoje, por não me preocupar com mais nada nem ninguém, é que me faz pensar: o que aconteceu comigo? Estou melhor hoje ou só envelheci? Amadureci ou me acostumei? Estou feliz ou só cansado?
            Porque hoje, apesar de ainda cambalear um pouco, eu aprendi a andar. Ainda não cheguei ao fim, até mesmo porque sinceramente não sei mais aonde quero chegar. Só sigo em frente, porque olhar para trás é cansativo e relativamente inútil. Ficar revendo aonde eu já pisei e aonde eu já caí não me tirou do lugar. E aprendi a me preocupar menos, a chorar menos, e a eventualmente sentir menos. Menos medo de crescer, de enfrentar o novo, de deixar as pessoas entrarem da minha vida e tudo isso é muito bom. Só não foi bom parar aqui e agora para respirar um pouco e, enquanto eu arrumava a minha bagagem antes de voltar a andar, eu percebi que perdi o amor pelo caminho. O amor que, quatro anos atrás, era o que me movia para tudo. O amor que era pelo que eu rezava antes de dormir, e pelo que eu esperava quando saia de casa no dia seguinte. O amor que às vezes eu pensava que não existia, até me surpreender com o quanto eu ainda acreditava mesmo depois de mais um desengano. O amor que eu achei que estava reservado para mim, completo com toda a felicidade que estava à minha espera há cem lágrimas de distância. Eu não sei o que aconteceu, mas em algum momento durante os últimos quatro anos, este amor definitivamente ficou para trás.
            E o pior mesmo foi só perceber agora a leveza da bagagem e a rapidez com a qual os dias passam, os compromissos vem e vão assim como as pessoas, até que eu finalmente me encontrei em um lugar muito parecido com o qual eu comecei a minha jornada: sozinho em casa, em um fim de noite melancólico e nostálgico, sonhando acordado com o amor da minha vida e aonde ela estaria dormindo agora. Pelo menos eu cresci o bastante para sonhar que felizmente ela esteja dormindo sozinha, pensando em me encontrar também. E por um instante eu me senti como há quatro anos não me sentia: ridiculamente esperançoso, constantemente apaixonado e absurdamente vivo... Só que em crise por tudo isso.
            É, muita coisa pode acontecer em quatro anos. Você pode ter amado muita gente ou, se tiver sorte, pode ainda estar com a mesma. Você pode estar quase se formando, e começando a se desesperar por tudo que ainda precisa escrever antes de cruzar a linha de chegada. Você pode ter mudado, ter amadurecido, e ter percebido exatamente o quanto o tempo é valioso, a vida é bela e o mundo é grande, e que nada disso se resume só à você. Mas se você tiver sorte, em um fim de noite qualquer, você pode revirar os olhos para trás e enxergar o quanto você andou para chegar até aqui, e que apesar de tudo que encontrou pelo caminho, você ainda é você.

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