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Crepúsculo, ou o último dos românticos

Quando eu tinha 14 anos eu fiz uma decisão que tornou-se o momento definitivo do meu caráter, e a razão da minha profunda frustração por anos posteriores; eu decidi que esperaria pela mulher dos meus sonhos aparecer na minha vida – que nossas almas se encontrariam meio à perdição do mundo e instantaneamente saberiamos que pertencemos juntos, assim dariamos as mãos e seguiriamos caminhando pela mesma direção… E viveriamos felizes para sempre. Juro.

Por limitar minha vida à espera de tal mulher aparecer, eu percebi exatamente quanto tempo em mãos eu tinha, e para passar tempo o que me restou foram os abençoados seriados americanos – dos quais eu aprendi não só lições como inglês também. E foi assim que eu desafiei todos os padrões possíveis ao tentar entender a essência por trás da teoria sobre como a busca pela pessoa perfeita é uma coisa feminina, e junto aos programas da revista da televisão à cabo que eu grifava para assistir, eu adicionei “Sex and the City” à minha lista. Todo mundo conhece a história ou pelo menos sabem algo de ouvir falar, mas havia algo além do que me era mostrado que eu não podia ignorar; o que estava realmente acontecendo eram pessoas tentando se acertar umas com as outras em relacionamentos, esperando encontrar tudo pelo que sonhavam numa vida a dois. E antes de sair por aí e fazer tudo que fiz, inclusive deixar inúmeras oportunidades passarem, eu tive que me perguntar: por que as mulheres podem se dedicar em manter o sonho de encontrar a pessoa perfeita, e os homens não?

Isto levanta uma série de questionamentos que passam desde a hipocrisia que dá sustentação para a sociedade até a dificuldade do adolescente em encontrar seu lugar no mundo. E não estou falando do mundo real, mas de encontrar o sentido no seu próprio mundo, antes mesmo de deixar outros entrarem. A construção do caráter, da personalidade, e o começo de escolhas do tipo, “o que eu quero para a minha vida?”… Ou então, “quem eu quero para a minha vida?”. Talvez eu estivesse afrente do meu tempo, talvez tivesse algo errado comigo, mas seja lá qual for a explicação eu fui adiante, e na maior das loucuras impensadas que um jovem poderia cometer, eu deixei o amor mostrar o caminho que eu deveria seguir. Se o que todos buscam nesse mundo é amor, e amor é a base para tudo, como eu poderia me perder? Pois é… Eu me perdi, e não foram uma ou duas vezes.

Outra sensação que está marcando época é o efeito “Crepúsculo” – uma história de fantasia e aventura e mistério… E vampiros. Mas os vampiros são o menor dos detalhes, porque a essência continua a mesma: a busca por amor, agora exposto como impossível, e os desafios que os personagens enfrentam para continuarem juntos. Não só a verdade de como fazer amigos verdadeiros, imagine então amor real, no mundo hoje é claramente visível em nossas próprias vidas – a medida que tomamos consciência de nós mesmos e o que estamos fazendo conosco e com os outros – o ponto que eu não pude deixar de explorar em “Crepúsculo” foi de como o amor impossível torna-se possível apesar de todos os apesares, inclusive de vampiros. E digo isso após ter visto o tamanho da fila na estréia do novo filme da série no cinema; centenas de pessoas com seus bilhetes na mão esperando ansiosamente para sentarem e absorverem sua dose de fantasia, que o mundo real fez necessário para continuarmos vivos. Precisamos de sonhos para nos tirar da cama de manhã quando o sol nasce, e precisamos de algo para acreditar quando deitamos a cabeça no travesseiro à noite. Até eu perceber que acreditar em algo que não podia ver mas que sabia que estava por aí – apenas longe do meu alcance – havia se tornado tudo para mim e pior, estava me satisfazendo. Quer dizer, até não satisfazer mais. Quando dizem que as mulheres amadurecem mais rápido que os homens, e que seria necessário trilhões de neurônios a mais para o homem sequer chegar perto de ter o intelecto de uma mulher, não é brincadeira. Dizem também que filmes pornôs e a Disney são as maiores fontes de frustração para as pessoas; queremos o amor das nossas vidas, perfeito em cada detalhe, e acima de tudo queremos que o sexo seja espetacular sem nem ter treinado antes. Acontecia em “Sex and the City”, acontece em “Crepúsculo”, acontece com o Mickey, e acontece na vida. Basta olhar além do óbvio para perceber a verdade escondida nas coisas e nas pessoas, e descobrir que nem sempre o que pensávamos realmente é do jeito que pensávamos.

Eu senti o auge da minha frustração ocorrer quando cliquei em confirmar minha inscrição em um site de namoro virtual – algo do tipo “encontre o seu par pefeito aqui” misturado com anúncios de “aumente o tamanho do seu pênis”. Quando o site me pediu uma pequena frase para dar início ao meu perfil, e à minha decadência, e parei, pensei bem no que poderia bem me definir, e escrevi: “O último dos românticos”. A verdade me atingiu como um soco ideológico no estômago, do tipo que confiava em meus amigos para atirarem em mim mas que com o tempo tive que aprender a me auto-espancar para conseguir ver as coisas claramente de novo; o último dos românticos? E o que aconteceu com o último dos românticos, para estar procurando sua alma-gêmea em um site de relacionamentos? Uma das minhas professoras disse algo no início das minhas aulas que me marcou, assim como muitas outras pérolas que se sucederam e que me fazem ter certeza de que no mínimo meu rumo profissional parece estar finalmente correndo bem. Ela disse, “todo mundo que quer ser único acaba sozinho”. Então aí estava o fim do último dos românticos; está sozinho, e deixou seu desespero silencioso tomar conta de seus dedos e expor sua miséria com a rapidez de um clique. Foi então que eu decidi dar um basta - para quê ser o único romântico? – e logo estava na concreta procura não da pessoa certa, mas de alguém para me fazer feliz hoje. Deixei todos os dias tornarem-se inúteis e iguais ao concentrar minhas forças no amanhã que nunca chega, apenas para descobrir exatamente até onde a frustração pode chegar. Quer saber? Foda-se.

Eis o segredo para se ter tudo: pare de esperar que será do jeito que você achou que seria; é verdade para os relacionamentos, e é verdade para a vida. Não me entenda errado, ainda espero encontrar a mulher da minha vida um dia; só que de agora em diante, enquanto este dia não chega, vou começar a me permitir ser feliz, só pra variar. Vejamos o que o mundo real tem de tão bom. Foi assim que o último dos românticos encontrou seu último desafio; a realidade de que ser feliz dependia apenas de si mesmo, e logo o sol se pôs. Como dizem, coisas incríveis podem acontecer ao longo da vida, especialmente quando o crepúsculo toma conta do céu. Crenças antigas morrem, novas esperanças nascem. E estou só começando.

Igor Costa Moresca. 18 anos, brasileiro, solteiro, ex-romântico, otimista incurável, que nunca deixa de acreditar no amor mesmo sem nem conhecê-lo de verdade. Eu mencionei “solteiro”?

Comentários

  1. Meeeeeu deeeeus.. rsrs
    não acredito nisso.! sera uma evolução? srsrs

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  2. "todo mundo que quer ser único acaba sozinho". Eu concordo... Acaba sozinho, mas consegue ser único. :]

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