Cascavel é um município que fica ao Oeste do Paraná com quase 300.000 habitantes e 1.105 km² de área, e há um ano atrás foi o lugar que escolhi para ser meu novo lar. Recém-formado do Ensino Médio, com pouco conhecimento sobre a vida - para não dizer, nada - e nada a perder a não ser rostos conhecidos de minha cidade natal, eu decidi que uma mudança de ares seria bom. Claro, por não saber nada sobre a vida até então, baseava minhas decisões na inconsequência, e da noite pro dia eu adquiri um novo cotidiano, uma nova casa, e novos desastres. Logo disse adeus à Londrina com a promessa no coração de que voltaria para casa assim que atingisse os objetivos que havia traçado para mim mesmo, fiz as malas e, 346 quilometros depois, aqui estava eu. Bem vindo ao mundo real.
Eu me lembro de tudo; desde a primeira vez em que alguém me parou na rua para pedir informação, a primeira vez que alguém me parou na rua para pedir informação e eu a mandei para o lugar certo, e até a primeira vez que eu mesmo não me perdi pelas ruas da cidade. Cascavel chega a ter um terço do tamanho de Londrina, e sua população sai perdendo em quesitos como simpatia, moralidade, e até higiene. Não todos, só alguns com os quais trombei nos primeiros meses da minha experiência. Conclusões que formularia depois, uma vez que ao me tornar o 300.001º habitante, eu também era o mais perdido de todos. Começar a faculdade de Jornalismo e ser contratado para o primeiro emprego ao mesmo tempo talvez não tenha ajudado muito. Mas em questão de algumas semanas, eu reconstrui uma base rotineira para meus dias, na esperança de não me perder tanto.
Então, algo deu errado. E num piscar de olhos eu me vi fora da faculdade e dentro do meu primeiro apartamento próprio, com nada a não ser meu emprego e minha saudade para me manter vivo. Pelo visto, Jornalismo não era o que eu queria - e morar com uma família que não era minha, também não. Morar sozinho, superado o desespero inicial, mostrou-se ser melhor do que eu esperava... Eventualmente. Com meu trabalho para me sustentar e meu pedaço de lar, total liberdade e inúmeras crises existenciais, eu percebi que estava solto no mundo sem rede de proteção, e se quisesse evitar admitir derrota, a única coisa a ser feita era seguir
E então eu a conheci. Quando tudo parecia estar perdido, e a cidade não poderia mais me surprrender com nada, ela veio do nada e, com a mesma rapidez, tornou-se tudo para mim. Mas como costuma acontecer nestes casos, o que vem fácil se vai fácil. E ao me deparar com a vida do modo como estava, ao depositar tudo nas mãos de uma pessoa e vê-la partir e deixar-me com nada, só havia uma coisa a fazer: erguer a cabeça, secar as lágrimas, e rezar para que tudo desse certo no final.
Seis meses depois. Ainda estou na cidade com meu velho emprego e minha casa, que inesperadamente tornaram-se meus maiores portos-seguros aqui, e apesar dos apesares, ainda segurei à parte de mim imutável a qualquer coisa: amor. De volta à faculdade, no final das contas estudar sobre a natureza humana - e o caos que esta esconde do mundo - acabou se mostrando minha nova paixão. E dessa vez irei até o final; só mais quatro anos e meio, e 300.000 trabalhos para chegar lá. Ultimamente eu andei pensando em algo; se somos todos constantes, e nossas vidas podem sofrer reviravoltas que nunca pensávamos que poderiam acontecer, e temos que aprender todo dia que mesmo quando achamos que já vimos de tudo na verdade não vimos nada ainda, talvez seja preciso abrir mão de quem você foi para tornar-se quem você será. Um dia desses eu estava andando pelas ruas da cidade e relembrando sobre o último ano: minhas alegrias, minhas lágrimas, minhas angústias e minhas vitórias. Ao caminhar de novo com a cabeça erguida, eu cheguei à uma conclusão: antes de vir para o mundo real, eu nunca havia me sentido tão vivo. Tudo isso e muito mais, numa pequena cidade ao Oeste do Paraná chamada Cascavel. Ou, como eu passei a chamar, meu lar adotivo.
Às vezes você precisa sair da casinha.
Música de Hoje: Rapture – Alicia Keys.
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