Eu deveria estar estudando agora mesmo, e provavelmente você também, mas se existe algo que meu histórico escolar não me deixa negar é o quanto estudar parece ser a coisa mais indiscutivelmente, incomparavelmente e insportavelmente chata que existe - especialmente no dia da prova. Particularmente, nunca consegui ser uma daquelas pessoas aparentemente dedicadas que possuem o cronograma de provas e atividades curriculares com meses de antecedência, que separam suas matérias com cuidado e mantém seus cadernos impecáveis, tudo para aproveitarem o máximo que puderem do estudo que a escola lhes fornece para, um dia, colherem o fruto do seu trabalho árduo anos mais tarde com uma carreira de sucesso e um vasto conhecimento do mundo que só poderia partir de leitura, leitura e mais leitura. Até gostaria de ser, mas sempre fui mais do tipo "estudo-na-véspera" durante todo o meu ensino fundamental e médio, até chegar na faculdade e atingir um novo nível de "desescolaridade"; estudar no dia da prova mesmo.
Mas legal mesmo é quando você simplesmente lê o máximo que pode e ainda assim não consegue absorver conteúdo suficiente para ao menos enrolar em algumas respostas, e quando nem mesmo esconder uma receita de bolo como resposta para alguma questão existencialista sobre o ser e o nada em uma prova de filosofia parece dar certo, nós como alunos nos vemos obrigados a recorrer ao nosso último recurso, aquele que constrói nosso caráter - ou a falta dele - e que nos persegue pelo resto de nossas vidas: nós colamos. Ao contrário das crenças populares, colar é uma tática mais arriscada e destemida que alguém pode tentar no meio de uma sala cheia de alunos desesperados e professores atentos a qualquer sinal de perturbação do silêncio. Alguns tentam contrabandear redações microscópicas em pequenos pedaços de papel que foram dobrados mil e uma vezes para caberem certeiramente em espaços estratégicos como no meio dos dedos, até os mais mirabolantes como escondê-los na capa da borracha, ou os mais perigosos como simplesmente deixá-los nos bolsos e coreografar uma manobra rápida para retirá-lo, copiá-lo e eliminá-lo em questão de segundos, antes de atrair qualquer olhar para a sua direção. Ao longo dos anos surgiram novas técnicas a partir da modernidade e da astúcia daqueles mais preguiçosos porém incansáveis desbravadores do crime estudantil organizado, como o envio de gabaritos por mensagens de texto em celulares, enquanto ainda aplicam técnicas mais arcaicas como anotar as respostas nos braços e pernas e cuidar para que fiquem escondidos debaixo da roupa sem que qualquer fiscal aviste seus resumos sobre a Revolução Francesa ou a fórmula da Bhaskara tatuados em seus tornozelos. Uma vez conheci um sujeito que enfrentou uma prova de inglês com três colunas de verbos transcritos por seus antebraços, mas foi pego pouco antes de conseguir completar todas as conjugações.
Minha experiência com colas até o terceiro ano do colegial se resumia a um pequeno bilhete contendo informações vitais para uma prova de História sobre a chegada da família real ao Brasil que foi dobrado e redobrado por minha ansiedade e medo de ser pego, até finalmente conseguir encontrar um meio de retirá-lo do bolso e extrair tudo o que precisava para garantir uma média, mas fui pego de surpresa quando o fiscal presente interrompeu sua marcha pelas fileiras e começou a voltar para minha direção, e quando minhas mãos não conseguiam mais guardar o bilhete de volta ao bolso não tive escolha a não ser engolir a cola - e fingir que se tratava apenas de um Trident que havia engolido com o papel porque tinha ouvido falar que conservava mais o sabor. Até o terceiro ano, uma estratégia que muitos homens costumavam usar era a de atrair mulheres sob o falso propósito de expandirem seus conhecimentos e eliminarem quaisquer dúvidas sobre o conteúdo ao formarem grupos de estudos, mas não passavam de meros pretextos para apenas agruparem-se fisicamente - e geralmente, em cima dos livros de Física.
Mas no final do terceiro ano, quando nossos boletins já estavam amassados e úmidos com nosso suor e lágrimas e toda a esperança parecia perdida, eu e meus passamos noites acordados dividindo conteúdos para serem estudados e planejando como trocar as provas, para que cada um fizesse o que pudesse para si e para os outros e para que todos pudessem comparecer à formatura como formandos. São poucos os momentos de tensão capazes de provarem o valor e o caráter de um homem em sua vida, e meio a uma sala lotada de possíveis repetentes com medo transbordando por seus olhos e sentindo a esperança escapar por seus dedos, passar a prova errada para o seu amigo e exclamar em voz alta com tamanha frustração e ainda assim não ser pego, é um exemplo clássico deles.
Por que passar por tudo isso quando a solução dos nossos problemas está exatamente nos livros e cadernos que carregamos conosco? Porque estudar é normal, mas dar vazão à criatividade é para poucos - para gênios e loucos capazes de transformar seu desespero em feitos artísticos e desbravadores, somente para passar com a média 6,0.
Ao som de: Another Brick in the Wall - Pink Floyd.
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