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Colecionando corações

Pela primeira vez na minha vida eu gostaria de não ter um coração. Parece que em se tratando de amor, sou sempre eu quem sai perdendo, com os olhos inchados de tanto chorar e sem voz para gritar e tentar chamá-la de volta. Mas ultimamente o inverso tem acontecido; outras mulheres tem sentido a minha falta, enquanto eu continuo me tornando mais frio do que a cidade. Outras mulheres vem brigando, esperneando e se irritando comigo à medida que deixei de atender às suas necessidades para, na maior das surpresas, tentar colocar a mim e meu pobre coração em primeiro lugar para variar. Mas tudo isso só serviu para me mostrar algo surpreendente; enquanto outros homens estavam saindo por aí beijando, abraçando e tocando o máximo de mulheres que podiam encontrar, eu estava fazendo algo mais profundo e indiscutivelmente incomparável este tempo todo - eu estava adentrando seus corações, somente para desaparecer em seguida sem sequer dar explicações, motivos ou até mesmo olhar para trás para ver se sobreviveram. Porque, honestamente, eu nunca pensei que faria tanta falta para alguém desse jeito, mas pelo visto não só me tornei amável, como também me tornei inesquecível. E enquanto eu pensava que quem estava apanhando e sofrendo e chorando esse tempo todo era eu, na verdade era eu quem estava causando esses sentimentos por todos os lugares que passava, e em todas as mulheres que ainda insistia em cativar. Eu estava colecionando corações sem saber, e conforme diz aquele bom e velho livro, eu havia me tornado responsável por eles também.

Infelizmente para algumas, talvez fosse tarde demais; o dano já estava feito e não há nada que eu poderia fazer para apagar as lembranças dos momentos que passamos juntos, e muito menos tentar voltar ao jeito que éramos antes. Se eu a deixei, foi por um motivo. Afinal, se eu ainda a desejasse sem dúvida ainda faria parte do meu mundo. Mas tudo isso só cabe a mim admitir e suportar; eu finalmente descobri como é estar do outro lado do amor, aquele que o recebe em vês de tentar entregá-lo desesperadamente a outra pessoa, e descobri também como é difícil recusar quando, apesar dos apesares, este amor não é aquele pelo qual eu estava procurando. Quando eu as quero, elas não me querem e, quando elas me querem, eu não as quero. Estranho, como algo tão contraditório pode fazer tanto sentido numa hora dessas, mas grande parte de mim sempre foi feita de contradições, então não é nada tão fora do esperado no meu caso.

Talvez não exista nada pior do que descobrir que seu coração e tudo que vive nele não passa de uma opção das mãos de outra pessoa que sequer deseja assumi-lo por inteiro, mas assim como eu aprendi que isto é algo pelo qual todos nós iremos sofrer uma hora ou outra, acreditem quando eu digo que não provoquei ou atraí o amor de nenhuma de vocês em vão; mas eu já fiz as contas e nós não daríamos certo. E assim como eu acreditava que nenhuma de vocês sentiria a minha falta, parte de mim também acreditava que vocês já não precisavam mais de mim. Ou então o contrário; fui eu quem passou a precisar mais de você, mas em vês de tentar passar dos limites pareceu menos doloroso dar meia volta e fingir que nada daquilo aconteceu. E então você voltou a ser você mesma, enquanto eu me tornei algo diferente. O que me tornei, ainda não sei. Mas, definitivamente, nunca pareceu tão difícil ser o dono de um coração quanto agora, com tantas dores para se responsabilizar e ainda sem ninguém em especial que me faça sentir inteiro.

Ao som de: Jar of Hearts – Christina Perri.

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