Pular para o conteúdo principal

Quem precisa do amanhã?


            Tudo está acabando. É assim que eu me sinto, mas não com um sentido ruim. As entregas de relatórios, TCCs, notas finais estão aí. As propagandas de Natal já estão passando na televisão. Meus amigos já estão fazendo planos para viajar pra praia e não, eu não sei se eu vou. O quarto ano da faculdade está acabando. O ano que disseram que seria o mais difícil, e não estavam errados quanto a isso. Não sei se estavam falando das matérias, do estágio, do TCC ou qualquer outro fator acadêmico, mas para mim o quarto ano não foi exatamente o mais difícil. Foi o mais intenso. O que exigiu de mim mais do que os três anos anteriores em termos de tentar responder aquela pergunta do primeiro dia de aula. Por que você escolheu a Psicologia? Eu gaguejei, abri a boca para soltar uma voz que definitivamente não parecia ser a minha, e disse que era porque eu queria ajudar as pessoas. É isso mesmo, Igor? Tudo está acabando. Você está pronto para ajudar as pessoas?
            2013 está acabando. Este é o ano novo, pessoal. Aquele ano novo que, há dez meses, parecia tão ridiculamente promissor, imensamente repleto de possibilidades e incrivelmente dotado de toda a esperança e otimismo possíveis, independente se nasceram da euforia dos fogos de artifício ou de todo aquele uísque que eu tomei enquanto assistia o brilho das estrelas se perderem nas explosões e no cheiro de pólvora que tomaram o céu. E agora só restam pouco menos de dois meses para que os parentes me visitem e o champanhe tome conta de novo. E o que aconteceu em 2013? Não acabou ainda e acho que só cantarei vitória realmente quando estiver na sacada, ou na praia, ou aonde quer que eu vá parar com o meu copo de uísque, contando os minutos para a meia noite que me trará mais ano de vida. Quer dizer, não só mais um ano de vida, mas um que promete ser, além de qualquer outra coisa, definitivo. Tudo está acabando, e 2014 promete fechar mais um ciclo. Isto é, se minhas notas não me desapontarem.
            A sensação de término me assombra e não é de hoje. Colocando o ano novo, o otimismo, a esperança e o uísque de lado por um instante, o fim ao qual me refiro como fonte de agonia e êxtase não tem nada a ver com fogos de artifício, mas com cartas de amor cheias de sentimentos esplendorosos que passaram do seu prazo de validade, abraços de conforto que não estão mais disponíveis e beijos inesperados que não parecem que vão me surpreender de novo tão cedo.
            Apesar de tudo e de todos de bom que 2013 me trouxe, eu não consigo deixar de pensar que quando aquela fatídica meia noite chegar, eu sentirei que minha companhia mais uma vez será um copo de uísque, e não aquela mulher com quem sonhei por anos, e que até acreditei que havia encontrado, mas que provavelmente não estará ao meu lado ainda. A não ser que 2013, não satisfeito em ter cumprido a promessa de se revelar como o melhor ano das nossas vidas, ainda tenha algumas cartas de amor escondidas na manga e está apenas esperando que eu baixe minha guarda para me surpreender mais uma vez e provar que, por mais que eu tenha conquistado em 2013 – todo o amor que foi bom enquanto durou, as amizades que eu incrivelmente fui capaz de manter, as mudanças pelas quais passei e sobrevivi, e as lições que aprendi mesmo quando estava mais propenso a me agarrar àquela velha opinião formada sobre tudo e todos do que me arriscar com algo novo – nada disto foi o bastante, e vai ser preciso mais um dia para descobrir exatamente aonde eu ainda chegarei nesta vida.
            Às vezes eu me desanimo e penso se esperar demais do amanhã pode ser mais perigoso do que otimista. Confesso que já ultrapassei minha cota desta vida escutando sermões dos meus amigos sobre a vida, o amor e o amanhã serem mesmo muito bonitos, mas que é preciso viver o hoje. Quem precisa do amanhã? 2013 está acabando e o que eu ainda estou tentando aprender com isto é que, realmente, o hoje vale a pena. O hoje foi bom e eu adorei estar com todos vocês. Mas o que eu quero, o que eu ainda espero, é não estar relativamente sozinho ao som de fogos de artifício de novo, me afogando em um drink enquanto preferia estar me afogando nas insanidades e ternuras de outra pessoa.
            E então eu aprendi a agradecer pelo hoje e cada dia que passa, mas que não só ainda existe um espaço em meu coração reservado para tudo que o amanhã ainda trará, como é exatamente disto que eu preciso em alguns dias. Porque alguns dias simplesmente não dão certo. Porque às vezes as pessoas estão longe. Porque eu precisava ir no mercado hoje mas não deu tempo. Porque eu ainda tenho tanta coisa pra fazer, roupa pra passar, barba pra tirar, relatórios pra escrever e – adivinhem só – louça pra lavar, que hoje vai ser pequeno.

            Eu preciso do amanhã. De copos de uísque, fogos de artifício e esperança de novo. Não me leve a mal, 2013, você fez um excelente trabalho em elevar minha vida para um grau de felicidade ainda maior do que eu esperava. Eu sou grato, de verdade. Cada ano tem sido melhor do que o anterior, mas nem cada dia tem meu agradecimento totalmente sincero. E é por isso que eu preciso do amanhã. Tudo está acabando, mas ainda há muito o que começar.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Os 5 estágios do Roacutan

            Olá. Meu nome é Igor Costa Moresca e eu não sou um alcoólatra. Muito pelo contrário, sou um apreciador, um namorador, um profissional em se tratando de bebidas. Sem preconceito, horário ou frescura com absolutamente nenhuma delas, acredito que existe sim o paraíso, e acredito que o harém particular que está reservado para mim certamente tem open bar. Já tive bebidas de todas as cores, de várias idades, de muitos amores, assim como todas as ressacas que eram possíveis de se tirar delas. Mas todo esse amor, essa dedicação e essas dores de cabeça há muito deixaram de fazer parte do meu dia a dia, tudo por uma causa maior. Até mesmo maior do que churrascos de aniversário, camarotes com bebida liberada e brindes à meia noite depois de um dia difícil. Maior do que o meu gosto pelos drinques, coquetéis e chopes, eu optei por mergulhar de cabeça numa tentativa de aprimorar a mim mesmo, em vês de continuar me afogando na mesmisse da minha melancolia existencial.            

A girafa e o chacal

Melhor do que os ensinamentos propostos por pensadores contemporâneos são as metáforas que eles usam para garantir que o que querem dizer seja mesmo absorvido. Não é à toa que, ao conceituar a importância da empatia dentro dos processos de comunicação não violenta, Marshall Rosenberg destacou as figuras da girafa e do chacal . Somos animais com tendências ambivalentes – logo, nada mais coerente do que sermos tratados como tal.  De acordo com Marshall, as girafas possuem o maior coração entre todos os mamíferos terrestre. O tamanho faz jus à sua força, superior 43 vezes a de um ser humano, necessária para bombear sangue por toda a extensão do seu pescoço até a cabeça. Como se sua visão privilegiada do horizonte não fosse evidente o suficiente, o animal é duplamente abençoado pela figura de linguagem: seu olhar é tão profundo quanto seus sentimentos.  Enquanto isso, o chacal opera primordialmente pelos impulsos violentos, julgando constantemente cada aspecto do ambiente ao seu re

Wile E.: o gênio, o mito, o coiote

Aí todo mundo no Facebook mudou o avatar para a imagem de algum desenho e eu não consegui achar mais ninguém, mas depois de um tempo eu resolvi brincar também. O clima de celebração do dia das crianças invadiu as redes sociais de tal maneira que todos nós acabamos tendo vários flashbacks com os desenhos de nossos colegas, dos programas que costumávamos assistir anos atrás quando éramos crianças e decorar o nome dos 150 pokemons era nosso único dever. E para ficar mais interativo, cada um mudou a imagem para um desenho com qual mais se identifica, e quando a minha vez chegou, não tive dúvidas para escolher nenhum outro senão meu ídolo de ontem, de hoje, e de sempre: o senhor Wile E. Coiote. Criado em 1948 como mais um integrante da família Looney Tunes, Wile foi imortalizado pelo apelido e pela fama de fracassado em sua meta de vida: pegar o Papa Léguas. Através de seu suposto intelecto superior e um acesso ilimitado ao arsenal de arapucas fornecidas pela companhia ACME, Wile tento