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O ultimato das mãos dadas no shopping


Houve um tempo em que eu duvidei. Eu sinceramente pensei que não iria acontecer. E por que deveria? O que eu já havia feito até então, para conquistar o famoso título de “merecedor”? Não que esse seja o pré-requisito, de fato. Eu não sei. É? Enfim. A questão é que, sim, por um tempo, eu pensei que não daria certo para mim. Apesar de todas as frases de efeito possíveis e imagináveis, escritas ao longo dos anos, nenhuma seria párea diante da realidade. Ah, desculpe; você não deve se lembrar do que estou falando. E o motivo para isto é o mesmo pelo qual eu nunca pensei que daria certo, desde os tempos em que eu escrevia e você aí sabia exatamente do que eu estava falando.

Estou falando do que sempre falei: amor. E por um tempo, eu pensei que não daria certo para mim.

Às vezes, eu estou errado. Tenho um certo talento para observar pequenos detalhes, mesmo quando parece que estou distante, fixado no horizonte. E tenho uma facilidade com as palavras que, até hoje, parece surpreender aqueles ao meu redor. A verdade é que não existe segredo: as palavras como nós as conhecemos existem há anos. O que elas dizem depende de você. O controle das frases está literalmente na ponta dos seus dedos. O modo como está frase irá terminar, cabe a mim decidir. Escrever é isso. É decidir. É reivindicar. E, às vezes, é dar um ponto final. 

Escrever uma história de amor, por outro lado, é um processo criativo muito mais complexo. Porque não depende somente de você. Já dizia o ditado: é preciso dois para bailar um tango. Mãos entrelaçadas em si, rumo à mesma direção, ou nada feito. E – pasme – tem momentos ao longo de uma história a dois, no qual as partes não necessariamente tem a mesma direção em mente. Eu, por exemplo, sempre optei por fugir. Ora pela inabilidade de ceder e me dispor a aprender a acompanhar um ritmo alheio ao meu, ora por medo de conseguir e ser assombrado por todas as outras melodias que não conheci. Um movimento infame que, ao seu estilo, também explica porque não sei dançar.

A verdade é que sempre fui apaixonado sim por relacionamentos. O modo como duas pessoas se encontram, se descobrem, se reúnem. Como peças de quebra-cabeça que se completam. Amantes de uma boa música, à procura de um par. Caminhos paralelos rumo a uma mão única. Ou, nesse caso, mãos dadas – no shopping.

A metáfora mais infame de todas também é a minha favorita. Em parte, por capturar minha devoção pela semiótica e, em parte, pelo maravilhoso mundo que existe por trás dos lugares comuns. O que seriam as mãos dadas no shopping senão a mais evidente prova de amor perante tudo e a todos? Tudo bem, sejamos francos... Depende do tamanho do shopping.

Não! E já expus meu ponto de vista sobre isso aqui. Especialmente em uma época marcada por dias nos quais eu me senti dolorosamente distante dessa meta. Mas é o que acontece com a maioria de nós ao longo do caminho: nem sempre somos guiados pelas mãos certas. Relacionamentos disformes, episódicos ou até mesmo imaginários fazem parte do percurso. E o fim do caminho tende a ser tão certeiro quanto o nosso abandono nele. 

Desde que me conheço por gente, eu tomei duas grandes decisões na vida: sairia por aí à procura de amor, e dependeria das palavras não apenas para nos sustentar, mas para contar a nossa história. Dez anos, três cidades e duas faculdades depois, cá estamos. O que eu nunca pensei que seria possível, tornou-se rotina. E desde o dia em que o amor mudou-se para a minha casa  - agora, nossa casa – eu estive ocupado reaprendendo tudo que pensei que soubesse sobre o mundo. Agora, nosso mundo. E para ser sincero, parece que eu não sabia de nada. Ou que eu não merecia. Mas a questão era outra: eu só não sabia exatamente como demonstrar minha gratidão por você.

Viver um amor é e sempre será mais desafiador do que escrever sobre desejar ter um algum dia. Mas esse parece ser um erro comum entre nós: quando se passa anos pensando sobre como iremos adorar o dia de amanhã, nosso total despreparo é escancarado quando o amanhã chega. Mas aqui estamos, você e eu. Juntos. 

Apesar de todas as dificuldades, mesmo entre tantas diferenças, vencendo lutas diárias e sonhando com mais tempo livre para desperdiçar nos perdendo no olhar do outro. A verdade é que, por um tempo, eu deixei de acreditar que você estava por aí. Mas estava, e ainda está, tão crente quanto eu, embora deveras ferida e exausta de tudo que passou. Por anos eu estive escrevendo, correndo, mudando, somente à procura da sua porta. Desesperado, embora despreparado, para encontrá-la. E quando finalmente se abriu para mim, não é à toa que alguns erros seriam cometidos. Eu não sabia o que poderia acontecer no dia depois de amanhã. Pra ser sincero, eu ainda não sei. Mas gostaria de descobrir, enquanto seguro a sua mão, rumo ao dia seguinte.

Chega um momento em que as mãos dadas no shopping enfim o deixam para retornar ao mundo lá fora. Talvez o momento seja este. Eu quero escrever o resto da nossa história, com você.

Quer se casar comigo?

(Ela disse sim.)

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